Cartas de Março (16)

Foto cedida por Magno Herrera Fotografias 

“DEUS PERMITE QUE VIVENCIEMOS SITUAÇÕES DESAGRADÁVEIS QUE POSSAM NOS ABRIR OS OLHOS CHEIOS DE ORGULHO E OSTENTAÇÃO”

Eu vendia balas na porta da escola. Foi a ideia que eu tive para poder me alimentar. Quando se é jovem, nem sempre, se tem maturidade para pensar no futuro. Daí, eu consegui comprar as balas e ficava na porta da escola esperando que alguém desse algum trocado para que eu pudesse me alimentar.
Sabe quantas balas eu tinha que vender para comprar um saco de arroz?
Eu tinha fome sim, mas pensava tanto na minha mocidade. Eu me arrependia de ter sido imprudente. Eu fracassei como pessoa e permiti que a miséria tomasse conta de mim.
Nunca tive uma vida fácil, sempre tivemos que trabalhar para ter as coisas, mas eu queria passear, comprar coisas caras e bonitas. Eu queria aproveitar a vida e não pensei em me precaver para o futuro.
Arrumei um marido que, aparentemente, me amava. Ficamos juntos por dezesseis anos. Eu não era má ou preguiçosa, mas me acomodei com a vida fácil.

Ele me sustentava e, a mim, cabia o trabalho doméstico e o cuidado com os filhos. Continuei com uma vida materialista e fútil. Morávamos de aluguel, mas eu não ligava porque a casa era muito boa e não faltava recursos para os passeios, viagens e férias.
O tempo passou, meus filhos cresceram e eu não fui muito apegada a eles. Não os mimava, até me irritavam um pouco. Meu esposo conheceu uma mulher que trabalhava na imobiliária. Ele se encantou com ela que era o meu oposto. Simples, muito trabalhadora, pensava em poupar para ter um futuro independente de quem quer que fosse. Meu esposo se apaixonou, mas ela não quis nada com ele porque sabia de nós, então, ele se separou de mim e se casou com ela.

Impressionante como o homem progrediu, comprou casa, estava mais arrumado e muito feliz. Eu não pude reclamar, acho que nem mesmo o amava, era cômodo para mim. Eu senti no bolso. Senti falta das comodidades porque depois que ele se foi, eu tive que procurar emprego e foi muito duro arrumar emprego naquela idade. Meus filhos me tratavam da mesma forma que eu os tratei e foram embora, assim que puderam. Eu não os culpo, como eles poderiam pensar em cuidar de mim, se eu nunca me preocupei tanto com eles?

Não me queixo. Eu soube compreendê-los e não queria ficar reclamando. Quando estava um pouco mais jovem fiz faxina, trabalhei no supermercado, mas logo a disposição acabou e precisei vender as balas na escola. Eu me constrangia, principalmente quando me lembrava da minha vida e do quanto eu tive boas oportunidades.
Acho que eu perdi muito tempo.

Fico pensando no e se. 

E se eu tivesse me esforçado mais para ser uma boa mãe? E se eu tivesse sido uma esposa dedicada? E se tivéssemos consolidado um amor em família que fosse sólido? E se eu tivesse estudado e tivesse uma profissão? E se eu tivesse pensado na minha velhice, em ter estabilidade como uma casa? Tudo teria sido tão diferente.
Eu olhava as crianças com suas mães e vi demonstrações de afeto que encheram meus olhos de lágrimas. Eu poderia ter sido uma pessoa melhor.
Eu não consegui pensar em nada disso, enquanto a minha vida era confortável e prazerosa. Eu precisei passar por privações para pensar que poderia ter me saído muito melhor. Eu poderia sim.
Eu entendo que Deus permite que vivenciemos situações desagradáveis que possam nos abrir os olhos cheios de orgulho e ostentação. Olhos grosseiros cheios de vaidade e preguiça.
Deus sabe de tudo o que é necessário para que possamos abrandar o caráter terrível e evoluir nem que seja na marra.
Eu preciso me esforçar mais na próxima chance.
MARIÂNGELA
28\03\20                                                                                                                             
-----------------Paula Alves----------------------

“SE AS PESSOAS TIVESSEM CONSCIÊNCIA DE QUE TUDO ÀS CLARAS É MAIS FÁCIL DE ADMINISTRAR”

Aquelas pedras eram belíssimas. Eu tive muita sorte com aquele marido que me amava tanto. Eu tive uma vida cheia de regalias e contemplações. Ele era comendador. Ele distribuía joias para todo o continente. Pedras preciosas, lindas!
Em dias normais, triviais, lá vinha ele com uma joia maravilhosa. Só para me agradar.
Eu fazia tudo para tratá-lo da maneira que ele gostava e posso dizer que eu era uma boa esposa, na medida do possível, até porque minha vida era fantástica, não poderia reclamar.

Mas, eu era astuta, ardilosa. Comecei a ficar com a pulga atrás da orelha por causa de uma serviçal. Uma mocinha muito bela que meu marido colocou para trabalhar em nossa casa. A menina era muito bem tratada por meu esposo. Ele não permitia que ela fizesse trabalhos muitos pesados, ele a dispensava muito antes do turno acabar e pagou cursos, estava preocupado com os estudos da moça.

Ah! Aquilo me deixou intrigada. Nós não tínhamos filhos, eu não podia ter, apesar das inúmeras tentativas, eu já havia me acostumado com a ideia de que seriamos, apenas nós dois. Fiquei ofendida com a delicadeza do meu esposo com a serviçal e fiquei de olho neles. Eu nunca havia desconfiado dele, mas achei que ele estava me traindo com a moçoila. Então, tratei de bisbilhotar nas coisas dela e qual não foi minha surpresa quando descobri uma joia belíssima escondida nas coisas dela?

A joia poderia ser minha, era muito parecida com todas as joias que meu esposo me dera. Fiquei louca, saí depressa do quarto, chamei a empregada e a espanquei. Ela ficou toda esfolada. Eu a demiti, joguei as roupas dela na rua e fiquei com a joia.
Ela gritava, dizia que eu estava enganada. Falou mesmo que a joia era a única coisa que restara de sua mãe que falecera anos atrás.

Eu nem quis saber. Fiquei com a joia acreditando nas minhas próprias conclusões. Meu marido estava viajando e quando chegou ficou desesperado. Ele chorou e disse que estava sendo castigado por mentir, por tê-la abandonado, por ter sido um malandro.
Eu não entendi nada. Estava enfurecida e ele disse que eu tinha que saber a verdade. Aquela menina era filha dele com uma empregada dos seus pais. Ele teve medo de se casar com ela e ficar sem direito a herança, ele manteve o sustento da menina escondido de todos. Mas, quando a mãe dela morreu, ele a levou para trabalhar em casa na intenção de cuidar dela e dos seus estudos.

Ele se dizia um covarde, mentiroso. A moça não sabia de nada e ele nunca teve coragem de olhar nos olhos da própria filha. Ele chorava e eu me compadeci.

Do nada, eu me coloquei no lugar dela. A indulgência é um dos maiores sinais de caridade. Eu fui indulgente e me senti mal. Eu não sei o que faria sem ninguém no mundo, com um pai que procurou seu comodismo a me amparar. Trabalhar como empregada na casa do próprio pai. Ser acusada de ladra pela madrasta. Não saber de nada e estar jogada na rua. Onde estaria ela?
Eu me senti mal, má, oportunista.
Abracei meu esposo, chorei, pedi perdão, mas cobrei dele não ter sido sincero.
Entre os casais e entre relacionamentos de forma geral, deveríamos pensar mais na sinceridade.

Se as pessoas tivessem consciência de que tudo às claras é mais fácil de administrar... Quando tem um assunto mal resolvido, resolva. Se ficar uma palavra sem ser dita, diga. Se ficou faltando um abraço, abrace. Sinta, reflita e expresse. Não deixe para depois e não esconda nada de ninguém. Quando somos verdadeiros e sinceros, quando não escondemos nada de ninguém, as pessoas têm mais confiança e acreditam em nós o tempo todo, mas isso ainda é raro na Terra porque as pessoas gostam de manipular situações.

Elas são tão interesseiras e gostam de achar que estão sempre passando a perna para se sentirem superiores. Eu pensei, rapidamente quis mudar de vida e me interessar sinceramente por alguém que não fosse eu. Ali estava a minha oportunidade de ser mãe da filha do meu esposo.
Meu marido e eu reviramos a cidade e a encontramos num banco de praça. Ele teve coragem quando segurei em sua mão e ele contou toda verdade. Ela aceitou ser nossa filha e, depois disso, parece que minha vida se transformou em outra vida. Foi como se eu tivesse nascido de novo e modificado tudo com aquela atitude.

Eu entendo que todos podem, por uma ação importante, mudar tudo, a vida toda. Eu me comprometi com ela. Fomos tão amigas, a família estava unida e feliz. Foi tudo o que nos faltou, aquela moça simples com propósitos bem diferentes dos meus. Participamos de obras sociais que me mostraram o valor da vida. Eu me transformei e devo tudo isso a ela, minha filha que não saiu do meu ventre, mas me modificou inteiramente.
EVANDRA
28\03\20
---------------------Paula Alves---------------------------

“NÃO TEM AÇÃO SEM REAÇÃO E NEM ATO SEM CONSEQUÊNCIA”

É uma prisão doutor. A minha mente trás amarras que eu ainda não consigo desatar. É como se os meus braços tivessem perdido os movimentos.
Eu já compreendo o quanto é errado. Eu já não seria capaz de cometer aqueles atos sem culpa, sem arrependimento e sem me punir por eles.

O tratamento é longo né? Eu entendo, sei do componente tóxico que trás para a parte neurológica e se eu não tiver um tempo adequado de liberação mental, de modificação do caráter, sei que vou nascer com danos neurológicos. É a benção de Deus para comigo, senão poderia errar novamente.
Eu não sei se consigo me lembrar. Eu ainda tenho vergonha. Aquelas meninas não precisavam passar por situações tão tendenciosas. Foram minhas alunas, todas elas. Eu queria ver o corpo, mas elas não precisavam se sentir molestadas.

Eu fiz com muitas, nunca machuquei o corpo e isso já foi um avanço diante das outras existências.
Nem sei o que dizer. Poderia justificar dizendo que todo homem é sujo como eu. Tem os tios que colocam as sobrinhas no colo, vários familiares que brincam e olham com desejo. Eu sei que tem mulher que brinca com menino, aconteceu comigo, a amiga da minha mãe dando banho. Doença mental para todo lado doutor. Os pais nem sonham. As pessoas estão tão envolvidas com seu trabalho e suas tarefas que deixam as crianças soltas. Sempre foi perigoso é que hoje todo mundo pode falar.

Eu fui castigado sim. Não tem ação sem reação e nem ato sem consequência. Tudo o que a gente faz no mundo tem paga. E se a gente não passa pela corrigenda no mundo dos vivos, paga no mundo dos mortos que é muito pior. Ai daquele que acha que se livrou porque ninguém viu. Coitado daquele que acha que se safou, foi “o esperto”. Coitado!
Eu abusei, pensei que a vida longa e a reputação sem manchas iam me livrar de pagar. Nunca imaginei que não morre. Quando cheguei deste lado, sofri como um monstro deve sofrer. Virei um farrapo, só me escondendo porque não queria sentir na pele, mas senti. É a Lei de Talião doutor que nos persegue. Sofra o que fez os outros sofrerem. Tem gente que vai gostar de saber que todo mal tem punição deste lado. A gente é que atrai porque fica mostrando o que fez o tempo todo. Como um outdoor que fica piscando seus erros para todos.

Quem vai permitir um malvado como eu sem punição?
Até os piores já tiveram filhas ou irmãzinhas, eu me dei muito mal.
Agora para limpar tudo isso, vai demorar né doutor? Tô querendo reencarnar para esquecer toda esta vida de escândalo, esta morte desgraçada, mas aí vou ter que assumir um corpo inválido, uma mente limitada com defeito neurológico. Nem sei o que é pior, eu ainda sou um criminoso. Me ajuda doutor, me ajuda.
JAISON
28\03\20

-----------------------Paula Alves---------------------------

“OS MAIS JOVENS CONSEGUEM E VOCÊ?”

Eles olhavam para mim e achavam que eu não pensava nada. Eu pensava demais. Os pensamentos eram como fleches que me denunciavam de coisas que eu tinha feito e de coisas que eu poderia fazer. “Aqui só tem gente ruim” - eu ouvia sempre.
Parecia que eu podia notar o que eles faziam por toda parte. Eu era tão jovem, as pessoas não pensavam que eu podia contar? Me achavam mais burra do que eu era de verdade.
Vi tantas vezes meu pai passar a mão na empregada, ela ria abusada e depois esperava mamãe sair para ir para o quarto com meu pai. Que horror!

Minha mãe pegava o dinheiro na carteira dele e ia jogar com as amigas, bebia tanto, eu ficava pensando: “como ela iria dirigir o carro daquele jeito?”
Nunca se preocupou com a gente dentro do carro, eu e meu irmão mais novo.
O meu tio sempre tentava me levar para brincar escondido de todo mundo, mas eu não ia porque tinha medo dele, aí me trancava no quarto.
Eu via minha irmã mais velha fumando, fugindo para não ir para a escola e muito mais.
Eu fui crescendo e via pelas ruas coisas muito ruins. Gente que pede porque tem fome e gente que come no restaurante e deixa comida boa no prato, para ir para o lixo. Fala que não pode ajudar e critica quem passa dificuldade. Desperdício e falta de caridade.

Via gente que trabalha de qualquer jeito, colocando a mão no nariz e no prato da cliente. Errando no troco, gritando com o porteiro. Sendo grosseira para vender o pão.
Eu só olhava e pensava muitas coisas. Foi como se a infância e a juventude servissem para observação. Eu precisava de tudo aquilo. Não critiquei ninguém, cada um de nós deve tomar as próprias atitudes. Cada um sabe dos seus motivos até para produzir o mal ou não produzir coisa alguma.

Se Deus permite o erro, quem sou eu para falar que não pode ser desta forma?

Mas, foi importante para mim, observar e anos depois tomar minhas próprias conclusões. Me formei psiquiatra. Existem loucos de todos os tipos. Pessoas que acreditam na história que contam para si mesmas e não admitem ser contestadas. Eu vi muitos absurdos e as pessoas sempre se achavam ofendidas ou cobertas de razão.

Com os pacientes não foi de outra forma e ainda é assim deste lado. Aprendi e aprendo com todos, são lições de todos os lados. Como garantir que aquilo que vemos é real ou se é nossa conjectura absurda do que acreditamos ser?

Como definir se aquilo que se vê ou se sente realmente está acontecendo com você?

Ainda mais quando fomos influenciados a vida toda, por tantas gerações a agirmos com egoísmo e crueldade?

É natural nos lares a competição entre os irmãos, por isso, os pais não deveriam se sentir frustrados nas partilhas dos bens, quando as pessoas se esquecem dos laços de sangue para brigarem por vendas de imóveis.

É natural a traição entre os casais, por isso, não devíamos nos sentir espantados com o número crescente de divórcios recentes ou com a forma descompromissada dos jovens tratarem os relacionamentos.

Tudo o que o mundo vive hoje foi naturalmente desencadeado até aqui. O número absurdo de doenças se justifica pelos padrões mentais doentios.
Tudo parte da mente, tudo tão ilusório e sem solução. Por quê?
Com tanto avanço, com tanta tecnologia e mentes tão brilhantes?
Observe, o que é real? O que você vê que é real? Você é real?

Deus encaminha todas as coisas e vai descortinar, mas apenas os que estão prontos resistirão. São muitas modificações. Padrões que terão de ser reinventados. Os mais jovens conseguem e você?
Mentalize pensamentos livres de tendências e doenças. Limpe seus pensamentos, tudo parte da essência, do Espírito. Vocês vão conseguir.
BIANCA
28\03\20
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Foto cedida por Magno Herreira Fotografias

“DAR ATENÇÃO PARA O QUE É REALMENTE IMPORTANTE”
A sensação era uma espécie de claustrofobia, pânico, desespero quando alguém se aproximava de mim. Dar a mão nem pensar, imagina, eu não sabia onde ele poderia ter se contaminado. Eu evitava sair porque ficava pensando nas coisas sujas que iria encontrar pela rua e nem precisava me esforçar.

Lixo jogado no chão, nas lanchonetes mesas quase sujas, a falta de preocupação por parte dos atendentes que entregavam os pratos de qualquer jeito, sem se preocuparem com a higiene dos aventais ou das próprias mãos.
Em todos os lugares, eu via situações que me deixavam enojada, por isso, me enclausurei. Preferi ficar em casa, no ambiente que eu mesma higienizava porque nunca encontrei alguém que pudesse cuidar da minha casa da maneira que eu achava correta.
Peguei tanto no pé dos meus familiares. Cheguei a ser controladora com meus filhos e esposo, chata mesmo.

Entendo que deve ter sido bem difícil para todos eles. Eu nunca permiti que bagunçassem a casa. Nunca permiti que ficassem descabelados, suados ou sujos, isso quer dizer, que os esportes ou as brincadeiras eram proibidos porque eu ficava imaginando que eles podiam contrair doenças e ficar sujeitos a internações hospitalares que me amedrontavam mais ainda. Até os carinhos com meu esposo estavam abolidos porque eu me sentia enojada, não gosto nem de pensar no que um beijo poderia conter. E o ato sexual então?

Por tudo isso, meu esposo, um dia, foi embora. Ele não aguentou as minhas esquivas, o meu desprezo. Era muita pressão mental, sujeira mental. Meus filhos cresceram e também desejaram um espaço mais comum e foram morar com o pai e a madrasta que era totalmente diferente de mim, uma bagunceira, desorganizada. Na casa dela todos podiam tudo. Eles adoraram aquela paz, aquele ambiente sem pressão.
Fiquei só. Precisava comprar o essencial e saia depressa nos horários em que eu sabia não ter quase ninguém nas ruas, fingia que não via os conhecidos para não cumprimentá-los e, num dia qualquer, fui abordada por uma vizinha que estava num mal dia e me disse vários desaforos, ou seja, as verdades que eu precisava ouvir há anos. Tudo aquilo que meus familiares estavam loucos para me dizer, mas não queriam me ofender e guardaram para si.

Ela disse que eu era uma compulsiva por limpeza, uma nojenta e que tinha medo, medo de morrer.
Por esta eu não estava esperando. Medo de morrer? Ela falou que eu era tão egoísta que tinha mais medo de morrer do que de ficar sem meus familiares. Ela ainda finalizou dizendo que eu me achava muito importante, mas que no fundo, todos foram embora porque eu não permiti ser importante para nenhum deles, eu os afastei de mim, egoísta e egocêntrica.
Eu voltei para casa indignada. Me calei, saí debochando, dizendo que ela estava num mal dia e precisava descontar em mim, mas fiquei raciocinando por dias. Até que ponto ela estava coberta de razões?

Eu tentei compreender onde foi que comecei com esta mania de limpeza a ponto de afastar todos de mim. Por que tanto medo de me contaminar, medo de adquirir uma doença? Realmente eu nem podia pensar na morte. Eu num caixão? Que horror! Fiquei toda arrepiada só de supor que isso poderia acontecer, mas a realidade era que, mais cedo ou mais tarde, isso teria de acontecer como coisa natural da vida. Eu não podia durar para sempre. Não naquele corpo (risos).
Eu tinha sim, medo da morte. Desespero de pensar que iam me enterrar e que eu iria acabar.
Vi que tudo o que eu fazia foi proveniente de uma internação que necessitei na infância. Eu, com cinco anos, tive uma crise terrível de bronquite e precisei ser internada. Meus pais ficaram tão angustiados e faziam de tudo para que eu me curasse. Mamãe dizia que eu nunca mais iria passar por uma situação daquelas. Ela falou que eu seria muito bem tratada, nunca mais precisaria de tratamento médico, não sofreria mais. Foi aí, que ela me cobriu de zelos, me ensinou a ficar atenta com higiene, sempre muito limpa e organizada. Eu não saia para brincar com as outras crianças e fui adquirindo todas as manias da minha mãe. Até que, tudo aquilo, se tornou parte de mim. Eu não queria adoecer e muito menos morrer.

Os meus momentos de solidão, depois da encrenca que tive com a vizinha, se tornaram terríveis. Eu precisava de alguém, eu queria desabafar, mas eu não tinha ninguém.

O FATO É QUE A VIDA DA GENTE PASSA TÃO RÁPIDO. EXISTEM COISAS IMPORTANTES QUE TEMOS QUE FAZER E QUANDO ESTAMOS NA NEURA, QUANDO ESTAMOS LIGADOS A PENSAMENTOS COMPULSIVOS, DEIXAMOS ESTAS OBRIGAÇÕES DE LADO PARA VIVER UMA ALIENAÇÃO QUE TE CASTRA, TE TOLHE OS MOVIMENTOS QUE IMPULSIONARIAM PARA A EVOLUÇÃO.

É como se a vida tivesse sido perdida por distrações que me desviaram do meu real objetivo.
Eu morri e fiquei desesperada. Parecia que o que eu mais temia, havia atraído para junto de mim porque antes da morte, eu tive uma doença bem complicada. Eu tive erisipela. Foi como se eu estivesse apodrecendo em vida. Um cheiro fétido, a pele soltando, se desfazendo, dor, nojo de mim mesma. Tudo o que eu não queria aconteceu. Hoje, eu sei que foi tudo proveniente do meu pensamento. 

TUDO O QUE VOCÊ PENSA COM FERVOR, VOCÊ SE CONCENTRA TANTO NAQUILO QUE ACABA ATRAINDO, É DA LEI DE ATRAÇÃO.

Não dá para correr. Talvez, se eu tivesse me esforçado para produzir outros pensamentos... Se eu tivesse colocado atenção em coisas mais importantes como ajudar alguém ou fazer um trabalho manual, pudesse ter tido um fim mais calmo, porém, eu precisava compreender tantas coisas.
Agora estou bem. Minhas pernas estão totalmente curadas, estou fazendo o tratamento psicológico que já me dá condições de trabalhar na limpeza do refeitório. Eu preciso melhorar para retornar. Colocar em prática o plano que ficou pendente. Dar atenção para o que é realmente importante.
ANA HELENA
21/03/20

-----------------------Paula Alves------------------

“ISSO É TUDO O QUE VOCÊ VAI PODER CARREGAR NA TRANSIÇÃO”

Eu tive pavor da morte. Não ia em hospitais nem para visitar parente enfermo, não ia em cemitérios porque eu acreditava que trazia mau agouro.
Eu me lembro do quanto minha mãe sofreu no leito de morte vítima de câncer na garganta, ela fumava tanto. Eu vi o padecimento dela e desejei nunca passar por aquilo.
Tentava não deixar transparecer. Eu nunca confessei o motivo pelo qual não ia nestes lugares. Eu nunca demonstrei fraqueza, mas na realidade, eu achava que a morte era um grande castigo. A velhice um grande absurdo. Eu me sentia forte e sábia aos cinquenta anos, mas as pessoas me tratavam como velha por causa dos malditos cabelos brancos, a pele enrugada, eu já não tinha o mesmo pique e ser avó me rebaixava a uma classe desfavorecida pelo tempo. Enfim, eu nunca mencionei minha indignação por tudo isso, mas aqui deste lado, não dá para esconder nada. O menor pensamento e ela capta tudo.

Então, comecei a pensar que, um dia, fatalmente eu iria morrer. O que aconteceria de mim?
De todas as minhas capacidades mentais, de todos os meus talentos e de minha história?
O que seria de minhas coisas e daqueles que me amavam?
Tudo seria apagado em pouco tempo porque as pessoas choram dois dias e depois retomam suas vidas. Mas, e eu?
O que seria de mim?
Para onde eu iria?
Seria o meu fim?
Eu acreditei que seria o meu fim e, por isso, me determinei a viver o presente. Eu desejei ser imortal, mas como não acreditava nesta possibilidade, eu fiquei um pouco louca.
Eu queria ser jovem novamente, antes que o fim chegasse para mim e não queria ninguém me controlando. Procurei minhas amigas, algumas desquitadas, outras viúvas e decidi sair um pouco, mas eu era casada e meu esposo achou aquilo um absurdo. Ele foi embora e, na hora, eu até gostei porque queria viver tudo o que eu nunca vivi. Eu quis me envolver em romances, descobrir o novo. Conheci Renato, bem mais jovem que eu. Tive a minha primeira decepção, fui chamada de velha, me frustrei, sofri.

Tentei mudar minha aparência usando recursos estéticos absurdos e não mudei nada, só gastei dinheiro e me desgastei.
Eu só perdi meu tempo. A morte chegou com uma parada cardíaca. Descobri que a morte não aniquila ninguém, mas traz reflexões. A morte te coloca diante de questões muito importantes da sua vida. Acho que isso é o pior da morte. Você olhar para dentro de si mesmo. Você se descobrir como é de verdade e se chocar com as escolhas ridículas que você fez. Se envergonhar do seu péssimo comportamento.

PERCEBER QUE VOCÊ SE COLOCOU EM SITUAÇÕES DE MESQUINHEZ, IGNORÂNCIA E VAIDADE, ORGULHO, OSTENTAÇÃO POR PURA PREGUIÇA DE SE MOVER E CAMINHAR NO PROGRESSO.

A morte é necessária porque todos nós temos que aprender a sermos responsáveis e racionais. É o momento de transição mais sério e consciencioso, onde você não poderá contar com aqueles que te sustentaram na vida, onde você não vai poder driblar a situação deixando para depois e nem vai poder enganar ninguém com desculpas esfarrapadas ou melindres. Não tem choro e nem vela.

QUANDO CHEGA A HORA A MALA DEVE ESTAR PRONTA. A MALA SÓ PODE LEVAR CONHECIMENTO E VIRTUDES. VOCÊ AINDA PODE ACRESCENTAR AFETOS E TAMBÉM AS SUAS AÇÕES BOAS OU MÁS.

Isso é tudo o que você vai poder carregar na transição. Sabendo que esta mala vai ficar com você, então, o ideal é que ela fosse leve, cheia de coisas agradáveis e prazerosas como belíssimas recordações e sentimentos purificados.
Eu morri e me deparei com cenas terríveis de pessoas tão iludidas com a vida quanto eu. Me arrependo muito por não ter me instruído mais, não ter feito trabalhos em prol do meu semelhante. Eu quero melhorar e me esforçar para viver bem na outra vida. Eu queira ter tido noção de que a morte é só um recomeço, por isso, não devemos temê-la. IRMA
21/03/10

-------------------------------------------------Paula Alves----------------------------------

“MAS, SE ELES TEMEM A MORTE PORQUE NÃO TENTAM CONSERVAR A VIDA?

Eu trabalhei no grupo de apoio dos alcóolicos anônimos. Fui professor e tive um pai alcóolatra que fez de nossas vidas um inferno. Meu pai era muito agressivo quando estava embriagado.
Eu cresci com cinco irmãos mais novos e apanhei muito. Eu, o mais velho e minha mãe éramos espancados todos os dias. Ela tentava me defender, eu tentava defendê-la, mas as marcas no corpo e na alma eram constantes.
Cresceu uma revolta dentro de mim. São situações que não se apagam nem depois da morte. Eu via o quanto ele bebia, o quanto ele fumava. Pegava o carro e saia disparado, daí conheceu as drogas mais pesadas e se viciava no quarto, não pensava em nós.

Crescemos pedindo a Deus por um pouco de paz, até que um dia, ele saiu com o carro alucinado e nós, apenas nos entreolhamos. Logo depois, soubemos do acidente.
Confesso, que a morte do meu pai foi um alívio para nós. A partir daí, nós tivemos paz naquela casa. Não passamos fome e dormimos tranquilos sem acordar com bofetadas.
Muito estranho pensar que a morte pode nos livrar de alguém, ainda mais sendo pai. Eu me culpei por pensar assim, nem tinha coragem de falar isso para os meus irmãos ou para minha mãe, mas eu estava me sentindo bem melhor.

Porém, eu olhava diferente para as pessoas. Eu não me liguei a vício nenhum porque tinha o exemplo do meu pai e não queria ser como ele, jamais. Fiquei careta e conseguia olhar para a sociedade com questionamentos, introspectivo fazia a minha análise.

SE O OBJETIVO É A PRESERVAÇÃO DA VIDA, POR QUE SERÁ QUE TEM TANTA GENTE ADIANTANDO A PRÓPRIA MORTE?

Ora, se as drogas de todos os tipos deterioram o organismo, sendo assim, adiantam a morte. Se dirigir em alta velocidade pode causar um acidente fatal, isso antecipa a morte. Ingerir alimentos que podem prejudicar o estado de saúde como alimentos muito salgados ou gordurosos que podem causar danos para o organismo, então, podem antecipar a morte. Se expor a situações de risco como esportes radicais, locais de alta criminalidade podem antecipar a morte. Fazer cirurgias estéticas totalmente desnecessárias, apenas com intenções vaidosas podem comprometer a saúde e, portanto, podem antecipar a morte, entre tantas outras coisas, tantas.

DAÍ, NÓS VAMOS ENTENDER PORQUE, DESTE LADO, SÃO TANTOS CONSIDERADOS SUICIDAS INDIRETOS.

Eu fiquei observando a vida das pessoas e comecei a trabalhar no grupo de alcóolicos anônimos. Eu achei que pudesse falar e incentivar as pessoas a darem valor à vida. Eu palestrei muito. Me esforcei na divulgação de um propósito de otimismo, fé, coragem para manter o equilíbrio mental e conseguir se manter longe das agressões de todos os tipos.
Eu não sei se vale a pena. As pessoas gostam de tudo isso. Eu não quis mudar o mundo, mas foram pouquíssimos que conseguiram sair do vício.

SE AS PESSOAS TÊM MEDO DA MORTE, POR QUE ELAS NÃO PRESERVAM A SUA VIDA?

Quando um amigo recebeu a notícia de que estava com cirrose, ele se deprimiu tanto, mas não parou de beber. Bebeu até acabar, até morrer.
Ainda tem gente que culpa Deus. Por que?
Será que Deus ainda tem que salvar da morte? Dar outra chance para o cara correr para o bar? Tudo é certo na Lei. Tudo é permitido, você tem o livre arbítrio e pode escolher qualquer caminho, mas todos os caminhos terão consequências que poderão ser desastrosas ou não. Ter juízo para escolher o caminho certo.
JOSÉ MIGUEL
21/03/20

--------------------Paula Alves---------------

Nada dura para sempre. A alegria tem tempo de duração, a tristeza também, o sofrimento também. Cada um reage de uma forma.
Existem os desesperados, os medrosos, os fragilizados, os injustiçados e os corajosos, aqueles que se aproveitam de toda catástrofe para pôr as mãos na massa, para aproveitar a ocasião e agradecer tudo o que tem de bom.

EM QUAL GRUPO VOCÊ ESTÁ?

Quando Deus nos cria, Ele tem um propósito para cada um, normalmente é para o crescimento pessoal, mas também para o crescimento coletivo, social.
Tudo o que importa é observar as necessidades reais de cada fase difícil e aproveitar o momento para adquirir valores essenciais. Não é para o nosso mal e tem como ser proveitoso.
A união da família num momento em que todos estavam tão dispersos, afastados, individualizados. Crianças na creche, pais separados, idosos rejeitados na família. A família se une e se olha nos olhos. Sem desespero você aprende a ser mãe de verdade e conhece o filho, entende quais são as necessidades educacionais. Conhecer o filho é penetrar a mente e os sentimentos, isso implica em extrair os defeitos morais e estimular virtudes essenciais ao ser humano para que você, mãe ou pai, possam desempenhar a missão que lhes foi concedida.

Ao mesmo tempo, você se olha no tempo porque tem tempo para isso. Você faz uma reforma íntima, lembra como tem sido seus comportamentos na sociedade, agora que você está enclausurado na sua casa.
Como você trata o seu chefe e os seus colegas de trabalho?
Como você dá bom dia aos vizinhos e ao porteiro?
Você reflete na sua postura social e seja sincero.
Você é um bom cidadão?
Você respeita as áreas públicas?
Joga lixo na rua, ao dirigir você joga lixo para fora do carro?
Você permite que o pedestre atravesse e dá passagem ao outro motorista?

Você pode observar como tem sido sua vida financeira. Por que, de repente, pode faltar o básico ou o essencial e você se questiona se era realmente necessário aquele sapato de grife, aquela bolsa de marca.
Foi imprescindível gastar tanto no cartão?
Será que você tem saúde financeira?
Com tudo isso, você consegue até raciocinar como é a vida do doente. Daquela pessoa que está inválida na casa há tantos anos. Aquele familiar que está hospitalizado e que você nunca fez questão de visitar.
Será que ele sofre com dores?
Com preocupações?
Será que ele tem fome?
Ou angústias?
Será que, se fosse você doente não ia desejar alguém ao seu lado?
 Alguém só para ter a certeza de que não está sozinho? Quem cuidaria de você?

Aproveitando que você está tão indulgente neste momento de transformação social global, você se põe a pensar como seria se você não tivesse nada no seu armário. Se faltasse o leite para o seu filho ou o cobertor na noite fria. Você reflete que sempre teve tanto, enquanto existem inúmeros no mundo que passam privações e sofrimentos variados. Crianças carentes, órfãos, pedintes, desempregados, pessoas que passam por preconceitos diários por conta da classe social, cor e até credo ou sexo.
Como seria se você tivesse que pedir alguma coisa para alguém?
Você teria vergonha?
Alguém te ajudaria?

É NESTAS HORAS QUE VOCÊ SE PÕE A PENSAR QUE NÓS CONSEGUIMOS VIVER COM MENOS.

Você percebe, sem desespero, o que é realmente importante. Saúde, família, fé, conhecimento. Você faz as considerações finais e nota que poderia ter uma vida mais simples e disponibilizar parte do seu tempo para estender a mão com humildade, de olhos nos olhos, com igualdade.

VOCÊ PODERIA DOAR MAIS PORQUE NÃO PRECISA DE TANTO, DOAR O SEU TRABALHO PARA AJUDAR QUEM NÃO PODE PAGAR PELO QUE VOCÊ FAZ, DOAR COMIDA, ROUPA, CARINHO E ATENÇÃO.

JÁ PENSOU SE CADA PROFISSIONAL DA SAÚDE DOASSE UM TRATAMENTO? PARA APENAS UMA PESSOA POR MÊS OU POR ANO? O QUE PODERIA ACONTECER?

SE VOCÊ QUE CONHECE O EVANGELHO PUDESSE, NESTE MOMENTO, SAIR DO GRUPO DOS ENTRISTECIDOS, DO GRUPO DOS DESESPERADOS, DOS AMEDRONTADOS E DISTRIBUÍSSE CONFORTO, PAZ E FÉ? O QUE PODERIA ACONTECER?

Notícia ruim vende muito, será que a fé e a esperança propagam na mesma velocidade? Para isso, tem que acreditar porque a fé só pode ser sincera, fiel.
Todos nós podemos escolher a atitude que tomaremos em momentos difíceis. Todos são únicos e diferenciados, mas temos algo comum que nos une.
Pense bem! Analise tudo ao seu redor. Você tem tempo para isso. Deus sabe o que faz!
CRISTÓVÃO 
      21/03/20
(grupo de auxilio)
                                  -------------------------Paula Alves------------------------


Foto cedida por Magno Herrerra Fotografias


“AS SUBSTÂNCIAS ENTORPECEM UM TANTO, ACLAMAM UM POUCO E ENCHEM DE CORAGEM, MAS FAZ DE NÓS SERES INSTINTIVOS, IRRACIONAIS, SEM LÓGICA NENHUMA”

Houve muitos percalços. Situações extremamente difíceis em que achei que me abandonariam de vez. Pensando bem em tudo o que aconteceu, nem sei como puderam ser tão pacientes e perseverantes.
Eles se comprometeram antes de reencarnar. Disseram que, apesar de todas as desavenças, iriam me ajudar a sair do vício. Desafetos de antigos tempos, participaram diretamente de minha derrocada e entrega às necessidades toxicológicas.
Por um momento, pensei que fosse da boca para fora, mas eu precisava retornar e aceitei. Formamos o acordo e eu aguardei. De longe, percebi a aproximação deles, jovens, apaixonados, dispostos a formar família e seguir no caminho do bem.
Eu me esforcei, estudei, fiz trabalhos, busquei o autocontrole, mas estava inseguro. Daí, reencarnei. A infância difícil me deixava agitado, ansioso, louco para me conter com alguma substância que pudesse acalmar os nervos. Meus pais não tinham vícios, mas era fácil encontrar um familiar que bebia, alguém com um cigarro na mão.

Ainda pequeno, eu não resisti apanhei uma bituca que tentava se manter acesa e dei uma tragada. Quanto prazer!
Eu ainda estava ligado ao vício. Dos nove anos em diante, eu busquei saciar minhas necessidades procurando esconder dos meus pais o meu transtorno, minha compulsão.
Eles nunca desistiram de mim. Fomos à igreja, eles me ensinaram um lindo Evangelho com Jesus vivo, ativo.
Quando eu estava entregue ao frenesi, nostálgico, clamava por Jesus e sentia o seu amparo. É uma loucura difícil de explicar, como um mundo fora da realidade. As substâncias entorpecem um tanto, aclamam um pouco e enchem de coragem, mas faz de nós seres instintivos, irracionais, sem lógica nenhuma.

Demorei para acordar, eu permiti que as sensações tomassem conta de mim até ouvir uma conversa dos meus pais. Eles foram sensatos e amorosos, diziam que fariam tudo para que eu me curasse e ficasse dono da minha consciência.
A partir dali, eu quis viver acordado. Tão complicado suportar a vontade, mas eu tive dentro de mim uma vontade estranha de estar atento, alerta, acordado e me controlei um dia, dois, três meses e refiz minha vida por eles, por mim e por todos que se viciam.

Com a possibilidade de alcançar a cura pude levar o meu depoimento e realizar um tratamento de auxílio a dependentes químicos que estamos realizando também deste lado com enorme prazer.
Eu sou muito grato aos meus pais José e Elisa.
SILVIO
14/03/20

----------------------Paula Alves-------------------

“DEUS SEMPRE PERMITE QUE A GENTE SE RECONCILIE A PARTIR DOS NOSSOS ESFORÇOS”

Listar tudo o que recebi com nossa relação seria impossível. Sabe quando Deus coloca anjos em nossa vida?
Eu tracei um plano bem tortuoso, enquanto estava no plano espiritual sabia das necessidades evolutivas e acreditei que valia a pena passar por inúmeras privações que pudessem me alavancar, porém, de novo na carne, tive tantas dificuldades que eu não consegui calar as queixas e indignação.

Mulher, pobre, sem estudo, me uni com um homem que tinha vícios morais e físicos. Ele me batia, me furtava e me molestava.
Eu tive quatro filhos com ele e quando achei que a vida não poderia ser mais difícil, o homem adquiri uma doença grave e caiu na cama necessitando dos meus cuidados.
Eu pensei que fosse me aproveitar da situação para matá-lo, mas consegui emprego numa casa de família e a minha patroa foi o anjo que mencionei no início.
Não somente porque ela me empregou e, com isso, eu pude arcar com as despesas de casa, mas também porque ela me mostrou uma vida que eu desconhecia. Eu sempre me achei vítima da situação. Nunca achei vantagens no meu sofrimento ou na minha vida desgraçada, porém depois de tantas conversas descobri coisas e conheci um Deus justo, amoroso que me possibilitava recomeçar.

O meu Deus me deu forças para superar tudo. Superar a raiva que eu tinha daquele homem para cuidar tão bem dele que eu o vi se reerguer e quando isso aconteceu, nós éramos duas pessoas diferentes que aprenderam a se respeitar. Pedi que ele fosse embora para que eu vivesse minha vida e ele aceitou, recuperado. Deus sempre permite que a gente se reconcilie a partir dos nossos esforços.
CÉLIA 
14/03/20

-------------------------Paula Alves-------------------

“EU QUERIA TER TIDO MAIS TEMPO”
Eu sentia muita dor de cabeça. Minha mãe achava que era uma medida extrema para chamar a atenção. Ela insistia em dizer que eu tinha ciúmes dela com meu pai. As dores pareciam aumentar e, como eu não conseguia fazê-la crer que eu me sentia tão mal, passei a tomar analgésicos por conta própria.
Eu tinha quatorze anos. Meu relacionamento com minha mãe sempre foi conturbado. Não parecia mãe, mas sim uma irmã que competia, implicava e rejeitava.

Com o passar dos dias, chegou a sonolência e a dificuldade para andar. A dor insuportável não aliviava com os remédios, por isso, procurei meu pai e confessei tudo o que sentia. Ele se desesperou, brigou com ela e me levou ao neurologista que se espantou com meus sintomas, imediatamente pediu exames específicos e diagnosticou um câncer raro no cérebro.

Minha mãe ficou chocada, ela se culpou porque a doença estava muito avançada e meu pai disse umas verdades difíceis de ouvir.
Eu precisei dela, eu sofri e não queria que ela tivesse sido dura e ausente a vida toda. Mas, sei que o sentimento que ela ofertou foi o melhor que pode dar. Eu vi nos olhos dela que estava arrependida e queria ter tido forças para se desculpar. Para mim, bastou!

Aqui tive provas de tudo. Compreendi tanta coisa. Eu já estou bem. Sem pesares, sem dores, não tenho mais a cicatriz cirúrgica que fizeram para extrair o tumor.
Eu revi o passado e me lembrei de nós. Os três num triângulo amoroso que acabou conosco.
Eu e ela brigando por ele. Nós precisamos nos envolver novamente e nos acertarmos com amor. Eu queria ter tido mais tempo, mas foi o suficiente para aprender a amá-la. Eu agradeço por tudo.
SÔNIA
14/03/20

------------------------Paula Alves------------------

“PERDI TEMPO COM TANTO ORGULHO FERIDO”

Vivida e experiente, talentosa e, mesmo assim, eu me deixei envolver.
Senti por ele um amor avassalador. Eu teria dado tudo, feito qualquer loucura para que ele tivesse ficado ao meu lado, mas após levar tudo o que quis ele simplesmente foi embora, me deixando em frangalhos.
Eu nuca aceitei, vivi muito tempo procurando aceitar e entender que ele não me amou, ele me usou e eu queria revidar. Eu quis confrontá-lo e desejei que ele sofresse uma parte do que sofri, mas desencarnei infeliz, sem conseguir isso.
Entre pensamentos confusos de paixão e revolta, eu o encontrei ainda encarnado. Ele já estava envelhecido com sua esposa, filhos e  netos. Quando vi que, apesar de tudo, ele conseguiu uma família, me desesperei e passei a persegui-los. Ele, nem sequer, se lembrava de mim e isso me indignava ainda mais. Eu nunca fui importante e aquele homem que ostentava uma reputação tão digna se esquecera da desonra e leviandade.
Eu sofri como obsessora no lar dele, desorganizei o ambiente doméstico, atormentei a esposa e me deparei com um homem realmente modificado.

Nunca pensei que as pessoas pudessem se reformar e se tornarem melhores por causa dos seus filhos e netos, mas ele se transformou para amar aos seus.
Eu tive amostras gratuitas de afetos sinceros, exemplos de humildade e devotamento que acabaram comigo.
Eu assumi que sempre quis um amor, eu sempre quis ter a minha família, chorei e vi uns seres lindos que se aproximaram de mim com extremoso carinho.
Eles fazem parte de mim. Reencontrei um homem que está ligado a mim, assim como irmãos, filhos de outras encarnações que aguardavam o meu retorno à colônia para traçarmos novos planos.
Eu perdi tempo com tanto orgulho ferido. Mas, hoje estou feliz por não ser só.
SUZANA LOURES

14/03/20


------------------------------Paula Alves--------------------------------

Foto cedida por Magno Herrera Fotografias

“O FATO É QUE O RESPEITO COMEÇA EM NÓS”

A revolta crescia dentro em mim. Em todos os momentos, minha insatisfação pelo corpo feminino que me colocava diante de situações tão constrangedoras. Submissa, rejeitada, abusada, discriminada. Mulher? Eu não sabia para que Deus tinha me criado.
Eu pensei que não poderia ser, apenas para sermos usadas pelos homens, mas era isso o que eu via em toda parte. Eu fui negra. Desde pequena sendo abusada por homens. Não tinha esta de que era castigo, eu via outras mulheres sendo usadas o tempo todo. Nós não podíamos dar opinião, falar com homem de igual para igual porque era insulto. Como assim?

Eu quis sumir do mundo tantas vezes. Paria e levavam a criança, eram vendidas, as meninas usadas também. Acho que era, por isso, que todos queriam varão. Já sabiam que mulher só servia para ser capacho. Ninguém queria ter filha mulher, não importava a raça. Era como doença, ninguém queria.
Daí você não podia ler, se fosse branca também não tinha grande coisa na vida porque não podia escolher casamento, era vendida do mesmo jeito, dote? E na hora de parir era aquela preocupação se tinha um homem no ventre, se fosse mulher seria humilhada pelo marido e pela família dele.
Que jeito para as mulheres? Daí morri sem muita esperança. Nem quis voltar como mulher, eu preferia nascer homem, mas me informaram que eu tinha que ser grata pelo sexo feminino que ensina muito, só vi coisa ruim, mas tive que aceitar novamente.
Renasci branca. Queria tanto estudar, ler, entender o que estava escrito naquelas gravuras, mas não podia. O pai falava que só ia ler para arrumar namorado. Falava que não tinha necessidade nenhuma de aprender a ler para cuidar de casa e de filhos. De novo maus tratos. Eu nem suportava quando os homens me olhavam, morria de medo de ser molestada. Parecia que, em toda parte, só olhavam para as mulheres pensando em sexo, em baixeza.

O pai me arrumou um marido, eu tinha quinze anos. Não tinha que querer, casei. O marido era terrível demais. Eu nem podia respirar na contrariedade que levava murros. Uma vez fiquei desacordada por duas horas e quando acordei ele já estava dormindo confortável, eu com o olho roxo, humilhada. Tive dezoito filhos e aquele homem querendo coisas até na minha velhice. Se achando no direito de me tocar como se o meu corpo pertencesse a ele.
Eu nem conseguia entender por que as mulheres tinham que sofrer tanto. Daí perguntei ao padre e ele disse que tinha que ser assim, o padecimento por causa da afronta da Eva. “A mulher precisa viver uma penitência sem fim” – disse ele. Quase morri de desgosto naquele mesmo dia. Mas, meu marido mexeu tanto comigo que desencarnei dois dias depois vítima de infarto. Acho que morri de raiva.

Falei, agora chega de nascer mulher, mas me disseram que eu ainda não tinha entendido a importância do sexo. Eu ainda tinha muita revolta. Nasci mulher branca na família abastada, tinha outras três irmãs e recebi um pai amantíssimo, uma mãe carinhosa que sempre defenderam os direitos das mulheres. Aquilo tudo foi presente de Deus. Parece até que eu estava sendo recompensada por tanto sofrimento.
Eu aprendi muito com eles. Depois eu os reconheci de outras vidas em que me trataram muito mal, eles estavam resgatando e eu agradeço por isso.
O fato é que pude estudar. Foi um sonho realizado. Eu tive dentro de casa os maiores exemplos de mulheres do bem. Mulheres comprometidas com a família, com a lealdade e com o compromisso social. Aprendi que eu, como mulher, poderia mostrar para as outras mulheres que o respeito parte de nós. Foi muito difícil para mim, chegar a esta conclusão porque eu mesma desmerecia o sexo feminino por tudo o que vivenciei.

Mas, o fato é que o respeito começa em nós. Durante muitos séculos, a mulher foi tratada como ser inferior ao homem. Nós não tivemos o direito ao estudo, à liberdade verbal, sexual, nada. Nós não podíamos ter, sequer, opinião. Eles nos calaram. Eles são a sociedade, são a própria Humanidade sem evolução, ligada aos instintos e à animalidade. A mulher tratada como procriadora e como ser que dava prazer ao homem. Ser que tinha obrigações no lar e que deveria servir ao seu superior – homem. Percebemos neste contexto, o quanto é importante para os Espíritos renascer em ambos os sexos. Porque foi só sentindo na pele que as coisas puderam melhorar para as mulheres.
Toda a revolta que eu tive em tantas jornadas, foi sendo utilizada para me mover. Eu amei minha atuação. Me dediquei à informação, ao auxílio e pude ajudar muitas mulheres que não tinham conhecimento dos seus direitos. Elas conseguiram sair de situações de risco com seus filhos, decorrentes de maus tratos, puderam se reerguer encontrando local apropriado para moradia e trabalho que permitiram o sustento e boas condições de vida.
Hoje, eu amo o sexo feminino. Me sinto digna, respeitada e desejo retornar como mulher para continuar o trabalho que um dia iniciei. Desejo participar ativamente na influenciação de outras mulheres para que, um dia, não haja mais mortes de mulheres por seus companheiros ressentidos, nunca mais estupros ou qualquer forma de repressão contra a mulher.
GEORGIA
08/03/20

---------------------Paula Alves---------------

“QUANDO AS MULHERES SE APOIAREM MAIS, OS HOMENS NOS RESPEITARÃO MAIS”

Eu falei que não concordava com o que ele disse e levei um tapa. Eu fiquei confusa, nem consegui revidar porque não acreditei que o homem que eu escolhi para ser meu companheiro estava me agredindo.
Eu nem falei nada, virei as costas e fui para o banheiro, chorei e não sabia se eu ia dar parte dele ou se tentava entender aquele comportamento. Meu marido sempre foi bom para mim. Ele estava passando por problemas financeiros e poderia perder o emprego, então, eu me lembrei de tudo o que estava envolvendo a cabeça dele e preferi ser tolerante. Quando eu saí do banheiro, ele estava me esperando do lado de fora e se ajoelhou para me pedir desculpas. Naquela noite, nós fizemos as pazes e ele jurou nunca mais me agredir.

Porém, depois daquele tapa, eu não podia contrariá-lo, sempre surgia uma ameaça que me fazia gelar, até que um dia, ele achou que eu estava flertando na festa de aniversário do nosso filho. Depois que as pessoas foram embora, ele me bateu tanto que eu fiquei zonza. Eu nem sabia o motivo. Eu vi a carinha do meu filho e me senti envergonhada. Eu tentei correr, mas ele me agarrou e bateu mais e mais.
Não queria contar os detalhes, mas isso está preso em minha mente, eu não consigo esquecer e parece que sinto novamente as dores do corpo e da alma. Sei que meu filho nunca esqueceu e todas as escolhas de sua vida tiveram a ver com aquele momento, infelizmente.

Eu deveria ter ido à polícia, mas ele ameaçou tirar meu filho de mim. Disse que eu não tinha renda e nem moradia porque ele ia me mandar embora da casa que ele havia construído com as próprias mãos. Enfim, na hora a gente vira burra, esquece que tem lei e pensa: “será que a lei dos homens que falha tanto vai me proteger?”
“Será que vai proteger meu filho?”
“Será que, neste país tão machista a mulher vai ter apoio e proteção?”

Eu fiquei em casa. Fiquei escondida na minha casa para que ninguém me visse machucada e deixei para lá, mas depois disso, virou um hábito me bater, até que um dia, ele bateu tanto que eu desmaiei. Ele me levou para o hospital, fiquei hospitalizada por dois meses e acordei deste lado profundamente arrependida por não ter tomado nenhuma iniciativa que pudesse ter me protegido daquele monstro, covarde.
Existem homens que são valentes com mulheres, mas mansinhos com outros homens. Nunca teriam a coragem de erguer a voz com outro homem, mas batem nas mães dos filhos deles. Eles brigam com as professoras, com as atendentes do supermercado, com qualquer mulher ele é fortão.

Será que estes homens apanharam tanto na infância que, inconscientemente, estão revidando nas próprias mães?

Eu penso nisso porque já me questionei se eles não tiveram mães, irmãs, tias, avós? Eu sei que tiveram. Todos têm mulheres na família. Será que eles gostariam de ver as mulheres surradas, humilhadas, mal tratadas e até mortas por seus companheiros?
Eu agi pior do que ele porque deveria ter me protegido e também ter pensado mais no meu filho que teve um trauma para todas as existências. Meu marido se safou da cadeia porque disse que eu caí da escada, quando ele chegou no lar eu estava desmaiada e ele me socorreu, preferiram acreditar.
NÓS DEVEMOS DENUNCIAR.
Nunca permitir gritos, insinuações, ofensas, xingos, humilhações verbais, físicas, sexuais. A mulher tem que se ver como uma preciosidade. Aquela que gera a vida e ama o mais próximo do amor de Deus deve ser respeitada, ouvida, auxiliada. Quando as mulheres se apoiarem mais, os homens nos respeitarão mais.
Mãe que ensina o filho desde pequeno a respeitar a irmãzinha, a prima, a vizinha. Mãe que ensina o filho a respeitar sua esposa, não procurar mulheres na rua, nunca vulgarizar uma mulher. Isso começa no lar, por isso, as mulheres como educadoras dos seus filhos e filhas são responsáveis pela forma como todos nos tratam.
Eu penso assim.
MANUELA
08/03/20

---------------------Paula Alves--------------

“EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO É TUDO O QUE PRECISAMOS PARA ABRIR OS OLHOS E DESPERTARMOS VIRTUDES ESSENCIAIS AO DESENVOLVIMENTO DO SER HUMANO”

Mas, houve um tempo em que a vida era bem diferente. As professoras eram idolatradas pelos alunos. Havia respeito, as meninas queriam ser professoras porque achavam linda a profissão de educadora.
Neste tempo, os homens abriam a porta do carro para as mulheres e carregavam as sacolas. Cavalheirismo, os homens estavam cientes que os corpos masculinos podem suportar mais carga e as mulheres têm que ter seus organismos protegidos para a maternidade tranquila.
Nesta época, a mulher era cortejada e quanto mais comprida a sua saia, mais o rapaz ficava interessado nela. Nunca atos comprometedores, zelavam o recato e prezavam a pureza, apenas a mão dada e beijos silenciosos após o compromisso formalizado.

Com o passar do tempo, a mulher se sentia menosprezada e desejou a igualdade dos sexos. Eu fui testemunha de muitas colegas que negaram dar a sacola pesada, desejavam trabalhos árduos como os homens, abrir a porta do carro era ofensa, como se deixasse claro que a mulher não pode fazer por si mesma. Ela quis igualdade social, financeira e pode trabalhar numa jornada abusiva ganhando muito menos. Ela quis competir com o homem e acabou por perder seus companheiros para outras que, levianamente, quiseram explorar os sentimentos de uns e outros tirando-os do lar. Casas de mães solteiras, crianças sem pai e mãe no lar, sem educação. Sociedade em desequilíbrio, sem base.
Por tanto tempo, a disputa dos sexos colocou a sociedade em choque, em guerra e pancadaria. Não teve nada de bom. Hoje, até mesmo a inversão de sexos, as incertezas, uma realidade que desanda sem imaginarmos como pode suceder nas próximas décadas onde as pessoas não se enxergam e não veem ninguém.
Seria necessário conscientização de que homem e mulher são imprescindíveis na sociedade se amparando ativamente. Cada um sabendo de suas potencialidades e também de suas limitações. Como yin e yang, como o claro e o escuro, se completam, se misturam para que todos possam evoluir.
Não tem o melhor ou o mais forte. Intelectualmente são iguais, dotados das mesmas possibilidades, mas os corpos têm suas diferenças marcantes que permitem vivenciar aspectos diferenciados do ser, integrando, participando, avançando no processo evolutivo.
Simples assim... Homem e mulher dentro do lar para educar os filhos. Homem e mulher na sociedade para construir disciplina e ordem, onde aquele que tem uma estrutura mais resistente desempenha força, o outro tem muitas outras habilidades para manifestar como gerar outro ser.

Respeitar-se e respeitar o outro só é possível quando sabemos quem somos e que nenhum de nós pode viver sozinho. Um dia, as pessoas terão todos os motivos para se lembrarem destas épocas em que denegriram, degeneraram, eliminaram o sexo feminino, mas também se aproveitaram do sexo feminino para justificar erros, para humilhar e abusar do sentimento alheio.
Educação e conscientização é tudo o que precisamos para abrir os olhos e despertarmos virtudes essenciais ao desenvolvimento do ser humano.
CELINA  
08/03/20
   
--------------------------Paula Alves----------------





Beleza também é prova. Eu precisava sentir na pele e, por isso, pedi e consegui. Recebi um corpo físico perfeito, cheio de saúde e vitalidade. Sempre fui encantadora e, à medida que crescia, deixava as pessoas fascinadas. Corpo escultural, cabelos lindos, sorriso cativante e um timbre de voz que enlouquecia os homens.

Por um momento, principalmente durante a adolescência, confesso, achava muito bom ter aquela aparência. Eu sempre consegui sorrisos e foi muito fácil conseguir a atenção dos professores, ser a popular da escola e ter os namorados que desejei. Era tudo muito simples, difícil receber um não, mas fui envelhecendo e ficando um pouco mais madura. Meus objetivos foram traçados e eu despertei uma vocação especial para a área da saúde. Minha tendência natural era cuidar de gente e eu me esforcei para me capacitar para isso. Estudei e dediquei anos para me graduar, queria ser competente e compenetrada em minha profissão.


Foi aí que percebi o quanto a beleza pode ser punhal. As pessoas me subestimavam acreditando que eu não tinha os conhecimentos necessários para desempenhar minha carreira. Era como se eu fosse, apenas um rosto bonito sem nenhuma percepção das coisas. Isso passou a me irritar bastante, ainda mais quando as minhas chefes eram mulheres e chegavam a me humilhar. Por outro lado, os homens também me humilhavam quando sutilmente me convidavam para sair para conseguir uma vaga ambicionada por muitos colegas. Os médicos sempre se aproximavam com risinhos, uma postura de vulgaridade. Eu me sentia mal por ser bonita.

Comecei a pensar o quanto a beleza estava me atrapalhando no ambiente de trabalho. Era difícil para conseguir amizades sinceras, já que minhas colegas ficavam irritadas com minhas conquistas e diziam que tinha motivo minha promoção, tudo com sarcasmo, com deboche.
Eu pensei que tudo aquilo também era um tipo de preconceito. Por que as bonitas não podem conjecturar? Por que não podem ser astutas e inteligentes? Por que as belas têm que ser vulgares e promíscuas? Por que tudo o que as bonitas conquistam está relacionado à sedução?

Eu pensei que o problema não estava em mim, mas sim, na forma como as pessoas observam diversas situações da vida.
Nós precisamos dialogar mais. Independente da condição física, financeira, intelectual ou, até mesmo, de plano. Nós precisamos dialogar e esclarecer muitos aspectos importantes para que possamos eliminar tantos preconceitos, tantas discriminações.
Eu fui discriminada por ser uma mulher bonita. Pode?
Eu me senti humilhada, ultrajada e sei que fui mal compreendida. Eu poderia ter alcançado outras posições, mas sei que conquistei tudo o que me pertencia, o que consegui atrai por meu esforço e boa vontade.
Em determinado momento da minha vida, resolvi me assumir como uma linda mulher que se reconhece como é verdadeiramente. Hoje tenho convicção de que a maneira como nos comportamos na sociedade faz toda a diferença com a forma como as pessoas vão nos observar e interagir conosco.

Eu me assumi como uma linda mulher que também tinha capacidades intelectuais suficientes para ser competente na profissão que escolheu exercer. A partir disso, tudo mudou. Eu acreditei em mim e fiz com que todos acreditassem. Eu poderia ter me escondido. Eu poderia ter me vitimizado como uma pessoa que foi surpreendida com um corpo belo que só lhe traz infelicidade, mas preferi agir de forma positiva.
É verdade que tem inconvenientes como tudo na vida, como todas as provas. Da mesma maneira que a falta da beleza também deve ser complicada, mas eu escolhi me superar e funcionou.
Eu exerci minha carreira por mais de trinta anos, enfermeira. Tive muita satisfação e reconhecimento no ambiente de trabalho, também fiquei satisfeita com a família que recebi. Esposo, filhos maravilhosos. Vida perfeita! Quando cheguei aqui colocaram diante de mim, os planos que tracei e me senti muito feliz por ter concluído como imaginava. Eu consegui!
Em outras vidas, me aproveitei da beleza para conquistar amantes, adquirir bens materiais, assim, conquistei desafetos, traí, menti, me viciei. Desgracei vidas por causa da beleza e, nesta chance que me deram, eu consegui conquistar virtudes, afetos e entendi tantas coisas, trabalhei arduamente e estou muito feliz. Como é bom perceber as glórias da vida. LÍDIA
08/03/20

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