Cartas de Abril (16)


“PENSEM NA VIDA ETERNA, NA IMORTALIDADE DA ALMA QUE É IMPERECÍVEL”

 

Eles não conseguiam entender por que doía tanto. Claro! Era um corpo muito velho, desgastes naturais ocasionados pelo tempo e esforços do trabalho.

Eu não posso negar que minha vida foi intensa, eu pensei em deixá-los com o mínimo de conforto que fosse possível, eles mereciam que o pai fizesse tudo por eles.

Mas, não pensei que doía tanto e que eles não poderiam entender. Aos poucos, fui me tornando um peso, um incômodo para aqueles que eram tão importantes para mim. Que pena! Fiz tudo por eles.

Acho que, se eu tivesse morrido mais cedo, não teria atrapalhado. Ouvi claramente quando disseram que perderam festas e viagens por minha causa, porque não queriam me deixar sozinho e eu agradeço por terem se incomodado, por não terem me abandonado.

Mas, obviamente eu pensei que teria sido melhor ser totalmente desprezado do que ouvir o que diziam com tanta franqueza. Falando como se eu não estivesse ouvindo, como se eu não estivesse presente.

Vi quando as doces crianças se transformaram em jovens insolentes e desnaturados. Eu senti forte no meu peito o desaparecimento daquelas crianças que me beijavam com tanto afeto. O que aconteceu com eles?

O fato é que o deslumbre pela vida material ilude muito. As pessoas pensam que têm o controle do tempo e da juventude. Acreditam cegamente que jamais vão sofrer os desgastes orgânicos ou as doenças crônicas. Sempre exalarão o frescor da mocidade e a beleza natural da vitalidade corporal, mas estão muito enganados. O tempo chega para todos e a chatice que acompanha a senilidade estará com todos.

 Eu me calei e fiquei num canto até que eles achassem que eu não conjecturava mais. Ai como foram inocentes. Dentro de mim, tantas lembranças, tantos momentos...

Demorou para me lembrar o quanto fui impetuoso e desejei abraçar o mundo todo num segundo. Somos todos iguais. As mesmas histórias e necessidades.

Vi aquele jovem autoritário adentrar a porta e quis esganá-lo! Meu neto era igualzinho a mim. Ele achou que eu não perceberia a forma astuta de mexer nas minhas coisas. Quando soltei um grito, ele estremeceu (há-há). O rapaz correu disparado.

Contei ao meu filho a falta de índole, diferente de mim que nunca tirei um centavo de ninguém. Mas, o pai do moleque queria se enganar e disse que eu estava delirando.

O pior cego é aquele que não quer enxergar. Ele precisava passar por todo o sofrimento para compreender que a educação não foi feita no lar. Ele preferiu me insultar, chamando de velho louco.

 

É assim que a família se desfacela. Em outras culturas, os mais velhos são tão respeitados. Tratados com tanta seriedade. São bem vistos e sempre solicitados como mestres ou orientadores, mas aqui no Brasil é uma tristeza.

Ser velho é como ser inútil. Não serve para mais nada e aqueles que são mais jovens faltam com respeito e delicadeza, insultos, gritos e omissão. É isso o que se recebe.

Raros são os mais velhos que podem contar com o olhar de admiração de seus filhos e netos. A maioria deles sempre tem uma justificativa para sua ausência ou descaso: trabalho, doença, viagem inadiável, cursos ou mesmo descanso. Tudo é mais importante do que o contato.

Foi assim que nos distanciamos até que eu não quisesse estar mais com eles. Chega um momento em que a solidão é mais proveitosa porque com ela, eu tinha minhas lembranças. Eu podia escolher quais lembranças estariam comigo.

Foi assim que, um dia, eu cai na sala e não consegui pedir ajuda. Eu temi porque senti meu coração doer e pensei que no fim, eu estaria sozinho, mas eu me enganei, tinha muita gente comigo. Pessoas que me amavam demais. Minha esposa, meus pais e até meus avós maternos, todos desencarnados que aguardavam por mim. Eles vieram me ajudar e eu fiquei com medo, no início, mas depois, entendi e agradeci pelo amparo.

Sabe o que mais me surpreendeu? Ver o quanto choraram no meu velório. Foi tanto desespero pela morte de um velho como outro qualquer.

Mas, se eles me tinham como um estorvo, alguém que só atrapalha, por que sofreram tanto?

Será que foi a saudade ou o remorso de saber que eu fiquei naquele quarto por quatro dias até que alguém tomasse a decisão de me visitar e encontrasse meu corpo caído no chão?

Não se entreguem a pensamentos infelizes, a imagens de corpos que se entregam a decomposição.

Pensem na vida eterna, na imortalidade da alma que é imperecível. Eu recebi assistência daqueles que me amavam verdadeiramente. Eu não sofri, pelo contrário, encontrei a paz, o consolo e a amizade que eu tanto buscava.

A morte natural, no tempo fixado, foi a benção do recomeço.

 

SÓCRATES

23/04/2022

 

---------Paula Alves------

 

“QUANDO NOS ACOSTUMAMOS A VER A VIDA COM BONS OLHOS SOMOS MAIS FELIZES, MENOS AMARGOS, MAIS TOLERANTES E AGRADÁVEIS PARA AQUELES QUE NOS CERCAM”

 

Você sempre pode escolher. Eu vivi anos da minha vida vendo o mal por toda parte. Eu tinha os olhos tão negativos e via o roubo, a discriminação, a violência, a fome, a corrupção, eu via o ruim e o feio. Com isso, eu reclamava, resmungava, me inquietava e me transformei numa pessoa dura e desagradável.

Não consegui perceber o quanto eu era inconveniente com minha cara amarrada e minhas palavras duras. Sabe aquelas verdades que podiam ser ditas com mais delicadeza? Mas, eu não media esforços para causar pânico e desagrado.

Achava que eu tinha que ser sincero, mas eu estava sendo cruel mesmo. Tem uma grande diferença.

Por isso, as pessoas se afastaram, mas eu não entendia que eu não permitia que elas se aproximassem de mim, por causa das minhas verdades.

Precisou receber um tratamento semelhante. Eu destratei uma subalterna e ela se sentiu indignada com minha postura. Disse que as pessoas que têm posição de comando deviam se comportar melhor, exatamente porque são vistas o tempo todo, são observadas e servem de exemplo, então, têm que ser exemplo.

Eu achei aquilo tudo tolice, mas reparei que todos se esquivavam de mim.

Falei com minha esposa e pedi franqueza, então, ela disse que eu era desagradável pela forma como eu enxergava o mundo. Ruins eram meus olhos porque tudo na vida tem duas faces, o bom e o ruim, o belo e o feio, o gordo e o magro, a luz e a escuridão, mas eu só via a coisa ruim, o tempo todo.

 

“Ruins eram meus olhos”. Eu tinha que mudar a forma como eu via o mundo e as pessoas do mundo. Fiz uma análise de quando começou tudo isso e ainda está difícil de lembrar. Recentemente me lembrei de que minha mãe dizia que eu não devia ser bobo. Devia estar atento porque as pessoas gostam de ganhar vantagem nas costas dos outros, eu tinha que estar atento. Acho que foi isso que me motivou a ver o pior em todos, eu nunca confiei.

Acho que quando nos acostumamos a ver a vida com bons olhos somos mais felizes, menos amargos, mais tolerantes e agradáveis para aqueles que nos cercam.

Eu me coloquei no lugar da minha esposa e dos meus subalternos, concordei com eles, eu era insuportável. Também não ia gostar de estar com alguém que só via o mal. Esta atitude faz mal. Eu viciei nesta postura e agora preciso mudar meu padrão mental. Espero que o senhor me ajude.

 

MARCOS

23/04/2022

 

-------Paula Alves-----

 

“AS CRIANCINHAS PODEM NÃO SABER DEFINIR AS PALAVRAS UMA A UMA, PORÉM, SENTEM A INTENSIDADE DAS PALAVRAS, A ENERGIA QUE EMANAM AO PRONUNCIÁ-LAS E ISSO FERE O CORPO INFANTIL”

  

Cheguei naquela casa com as melhores intenções. Eu acreditei que poderia ser amado. Estava ansioso para demonstrar o quanto evolui, instintivamente, eu sabia que devia mostrar o meu amor e que eu estava em paz, mas eles não tinham tempo.

Meus pais tinham muitos compromissos e eu ficava sempre na escola ou com meus avós.

Aquela vida não me parecia certa.

Por que será que pessoas escolhem se casar e gostam de ficar separados?

Por que será que pessoas decidem ter filhos e não se esforçam para cuidar deles?

Aquela escola parecia uma prisão para crianças. Eu chegava tão cedo e saia de tardinha. As moças eram bondosas, mas elas não podiam dar afeto ou atenção, tinham muito trabalho com tantos pequeninos que estavam ali, ainda podia ter sido pior, eu sei.

Não estou me queixando, na verdade, sei que não deve ser fácil eu prejudiquei tanto a vida deles na encarnação anterior...

Mas, eu acreditei que pudéssemos nos conhecer melhor e formar laços de amor e paz. Eu tentei...

Naquela noite, eu vi a indignação da mãe. Ela estava cansada e queria passear com as amigas, mas o pai disse que ele não podia ser responsável pela criança — eu.

Eles brigaram e ouvi quando disseram que aquela não era a vida que buscavam para si. Eles podiam ter vivido coisas boas sem os encargos daquela família. Fiquei tão triste porque eles não me viam, não entendiam que eu os compreendia.

As criancinhas podem não saber definir as palavras uma a uma, porém, sentem a intensidade das palavras, a energia que emanam ao pronunciá-las e isso fere o corpo infantil.

Eu senti tanto, me senti indesejado, humilhado e senti meu corpo esmorecer. Logo, a mãe viu que eu estava vermelho, ela colocou a destra em minha testinha infantil e falou que eu ardia.

Achei que ela fosse cuidar bem de mim, até fiquei um pouco contente, mas ela gritou: “POR QUE HOJE?”

Ela me pegou com força e deu tanto remédio que eu quase engasguei. Ela estava furiosa e eu quis chorar, mas fiquei com medo. O corpo começou a ficar pesado e eu dormi. Naquela noite, eu aprendi muitas coisas. Nós nunca estamos sozinhos e sempre tem gente que gosta de nós, cada um de nós, tem seus afetos no plano espiritual.

Eu vi quando uma amiga se aproximou de mim e falou que, infelizmente, eu não podia ficar mais. Daí acordei com o pai me carregando para o hospital, eles brigaram muito no carro. Eu gostei de sentir o cheiro da mãe quando ela me levou no colo.

Eles entraram correndo no hospital e o médico ficou irritado com eles. Disse que tentariam de tudo, mas no momento em que me colocaram na maca senti muito frio, vi muita gente e acordei aqui.

Demorou meses para eu voltar a ter este corpo de jovem. Ser criança não é fácil doutor. Eu me esforcei para não sentir revolta deles quando entendi que desencarnei por puro descaso. Eu não precisava voltar agora, tinha muitos planos e objetivos, mas foi melhor. A equipe que me assistia compreendeu que eles se recusaram. Acontece, sabe doutor.

A misericórdia divina permite que nos amparem e nos tragam de volta, nestes casos. Criança nunca fica desamparada. Mas, eu me sinto frustrado demais.

 

LUCAS

23/04/2022

 

-------Paula Alves-----

 

“SE PREOCUPA COM O SEU PAPEL NO MUNDO”

 

 Não tenha medo de lembrar. Não tente me esquecer. Eu fiquei com a melhor parte de nós porque aqui as lembranças ganham forma.

Tudo o que vivi me encheu de alegria e transformou o meu ser. Minha bagagem esteve repleta de bons momentos e modificações necessárias que só podiam ocorrer com a sua ajuda.

Você sempre achou que não faz diferença e que as pessoas não podem mudar por nossa causa. “Nós só podemos mudar a nós mesmos, nunca os outros.”

Eu concordava, achava que era assim que funcionava, mas estávamos errados. As pessoas percebem, elas sentem e notam nossas tendências, elas observam nossas atitudes sociais e podem utilizar nossos exemplos para modificação pessoal.

 Eu mudei muito por você.

Não sofri, foi no tempo certo, estou bem, mas eu sinto a revolta, a tristeza e a sua insegurança. Sensação de quem perdeu a vontade de viver que não combina com você.

A vida e a morte são questionáveis, depende do ponto de vista de cada um. Se analisarmos nossas situações ficaremos um pouco confusos porque para mim, esta é a verdadeira realidade e a verdadeira vida. A minha forma de sentir agora, é mais intensa do que antes, por isso, posso dizer o quanto te amo para sempre.

 

Tudo o que se passa neste seu mundo é ilusório e transitório, é passageiro. Não se desgaste tanto, não sofra demais por um momento que é tão breve.

A maior parte dos problemas vividos no seu mundo são fáceis de solucionar, um dia, você não vai lembrar da maioria deles. Então, não esquenta muito, vive intensamente.

Se preocupe com o trajeto, com as sensações e a ações diárias. Se preocupa com o seu papel no mundo. Tenta não se desviar do seu objetivo e realiza tudo com a cabeça no lugar, racional. Sabendo que tudo o que fizer, de bom ou ruim, faz você chegar num lugar bom ou noutro não tão bom.

Dependendo disso tudo, vamos nos reencontrar ou não.

Isso é tudo o que importa! Não é o que você vai conquistar: carro, casa, títulos, nada disso, mas o que você faz por onde anda. A maneira como você se comporta é que faz toda a diferença.

Como você se comporta com todos a sua volta e a forma como você honra a Deus. Isso faz bastante diferença. A gente não se preocupava com isso. Nem sabia que podia importar a forma de honrar a Deus, de se envolver com a espiritualidade e a maneira de se comportar no mundo, com as outras pessoas, mas vai ser fundamental para abrir as portas do céu, do nosso céu.

Vai por mim é bem diferente do que a gente pensava. Segue na fé e não esquece que eu te amo.

 

EMÍLIO    

23/04/2022        

 -------Paula Alves------




“O DIA SANTO PEDIA INTROSPECÇÃO. CALAR E OUVIR O PRÓPRIO CORAÇÃO”

 Como podem não se lembrar? Como não se resguardar?

Povos sem fé! Gente sem devoção!

Ambicionam adquirir mundos e fundos, mas nada sugerem à evolução das almas, entregues as festas e desperdícios sem razão.

Eu ouvi os risos, tentei não me perturbar. Eu precisava me concentrar na prece.

O dia era santo, devia ser dedicado à introspecção. Fiz tudo o que pude, desde aquietar a mente e não perturbar o coração.

Eu peguei o Livro Sagrado, li e reli, me envolvi com o martírio. Eu chorei.

Também fui um hipócrita, eu também não liguei.

Foram tantos anos onde as necessidades mundanas dominaram minha existência. Eu não o seguia.

Mas, após me envolver com ele, eu compreendi. Foi necessário um sofrimento, uma depuração para que eu visse no Mestre o único que poderia me conduzir ao Pai.

Então, vi o descaso, a falta de respeito, a imolação. A crucificação que se repetia, todos os dias e o calvário que me incomodava, me doía.

Quando meus vizinhos cantavam e bebiam na Santa sexta, pude sentir na pele como podia ter sido a soltura de Barrabás. Jesus condoído aguardando o desfecho final.

Eles não querem saber, eles preferem a satisfação dos prazeres terrenos.

Eu me surpreendi com a clareza dos fatos, consegui enxergar de forma tão real. Eu também agi assim, mas após a conversão pude analisar as atitudes e enxergar o quanto erram, o quanto se atrasam.

Ninguém estava ali se preocupando com o progresso e com o futuro do ser. As pessoas aproveitaram para festejar.

Mas, o dia santo pedia introspecção. Calar e ouvir o próprio coração, numa atitude genuína para identificar as necessidades interiores.

 

Cada um de nós devia observar a fase do martírio como a oportunidade de elevação, renovação. Em prol do crescimento pessoal.

Identificar os pontos positivos e os negativos que precisam de reajustes.

Considerar-se cristão ativo é ofertar ao mundo o melhor de si para matar a fome e a sede, cobrir os nús, acalentar os angustiados, esclarecer os ignorantes e combater injustiças, vícios e crimes, ou seja, melhorar a humanidade como propósito de vida.

Que nenhum cristão negue a si mesmo a bendita oportunidade de seguir Jesus como servo fiel. Não se pode afirmar cristão aquele que não se converteu sinceramente ao Mestre e não se colocou às suas ordens.

Viver os prazeres do mundo e seguir Jesus não confere. Andar num caminho de renúncia ao trabalho, assistência e amor, não é seguir Jesus.

Não é para beneficiar ao mundo que somos seguidores, mas em benefício próprio e integral da própria salvação.

 

RUBENS

15/04/2022

 

----Paula Alves---

 

“DE QUE SERVE SE PRIVAR DO QUE ENTRA PELA BOCA, SE NÃO SE REFORMA PARA REALIZAR BENFEITORIAS?”

 

Foram dias de flagelo. Acreditávamos na purificação da alma, a partir do martírio do corpo. Eu fazia parte de uma família tradicional, todos nós devíamos seguir os costumes desde pequenos, então, a semana santa não era bem aguardada por nós porque sofríamos demais.

Eu era pequena quando minha mãe me ensinou a purificação através dos flagelos. Eu achei aquilo terrível, disse que não queria, mas mamãe falou que se eu não fizesse, a surra deixaria mais marcas.

 

Depois de anos realizando as penitências da carne, anos em que me pus a questionar às escondidas, resolvi me libertar, eu fui embora dali.

Nunca concordei. “A carne para nada serve, o Espírito é que vivifica” – disse ele.

Verdade, se a carne para nada serve, do que adiantava castigar a carne e, conforme as cicatrizes se estabeleciam, as pessoas continuavam com a vida de sempre, sem transformação moral, sem renovação?

Eu penso que o cristão deve martirizar suas mazelas morais, seu orgulho, sua ambição, seus vícios, castigá-los até aniquilar com todos eles.

Devemos nos preocupar com a moralização, cuidar do Espírito, da renovação dos pensamentos e melhorarmos as palavras e atos sociais.

A pessoa fica uma semana se privando de diversas coisas, alimentares, verbais, porém, passada uma semana, ela tem as mesmas atitudes de sempre, volta a criticar as pessoas, sendo cruel, maledicente, ambiciosa, maldosa. Ela nunca ajuda seus semelhantes, rouba, trai, mente.

De que serve se privar do que entra pela boca, se não se reforma para realizar benfeitorias?

Eu queria que as pessoas compreendessem que mais vale o coração purificado do que a carne martirizada. Queria que os seguidores de Jesus tivessem um compromisso real, cheio de fé e esperança e pudessem seguir seus passos, sendo humildes com todos, bons, castos, serenos, amando e perdoando, ensinando e conduzindo.

Eu queria tanto que eles entendessem...

 

MARILDA

15/04/2022

 

----Paula Alves----

 

“A CERTEZA DE TRABALHO PRESTADO PELO MUITO QUE LHE FOI OFERTADO É A BENÇÃO DE PROFERIR AS PALAVRAS DO IRMÃO MAIOR”

 

Eu demorei para enxergar a grandeza daquele ser, mas quando me envolvi com sua luz, não pude recusar a missão de segui-lo.

Muitos debocharam, outros se distanciaram de mim, mas o compromisso, o chamamento foi muito maior que todos os envolvimentos sociais.

“Quem ama a sua esposa mais do que a mim, não é digno de mim” – disse ele.

Ela não queria que eu pregasse. Disse que eu a envergonhava falando do Evangelho. Como?

Eu devia ser um homem que a orgulhava por minha tentativa de me manter no caminho reto, pela modificação moral que desejei realizar para ser servo de Jesus, realizando o trabalho de discipulado, mas ela tinha vergonha de mim.

Não durou nem três anos, menos do que todo o tempo messiânico. Ela foi embora e, logo se casou novamente. Riam de mim, por toda parte.

“Ali vai o profeta!” – riam.

 

Eu estava acostumado, mas não me rendia aos apontamentos e achincalhações.

No fundo, você sabe quando tem que servir, quando tem que peregrinar em nome do Mestre. Parecia que aquele trabalho árduo e cansativo era infrutífero, mas sempre tinha uma pessoa que ouvia e se transformava pela Palavra.

Aqueles que ouviam e absorviam os ensinamentos podendo se transformar e distribuir a Palavra por aí como novos discípulos eram a Terra Boa.

 Mas, existiam aqueles falsos profetas que se aproveitavam da oportunidade de servir, apenas para ganhar vantagens, isso não me alegrava. Pessoas com tanta instrução, conhecimento da palavra que faziam doutrina pessoal. Usavam seu tempo precioso para exaltarem a si mesmos, para obter prestígio social ou vantagens financeiras. Tinha de tudo.

Eu não podia usar meu tempo para isso porque eu tinha muito o que falar sobre o Cristianismo, sobre a Doutrina do Mestre.

Meu tempo era precioso, sagrado, eu precisava proclamar a Palavra do Senhor.

Fiz! Trabalhei mais de cinquenta anos pregando. Nunca tive igreja, me apresentei ao Senhor despido de formalidades ou desejos pessoais, eu queria servir em agradecimento por estar preenchido com a sua pessoa, com o seu amor.

A intenção do seguidor de Jesus é agradecer, trabalhar por gratidão a tudo o que recebe dos céus. A certeza de trabalho prestado pelo muito que lhe foi ofertado é a benção de proferir as palavras do Irmão Maior.

Aquele que tem a possibilidade de servir e sabe a grandeza, a importância e a necessidade de distribuir a Palavra como semente do bem, devia se dedicar mais, se comprometer com sinceridade. Falar aos quatro ventos sobre a misericórdia do Pai e a pureza do Filho, atuando com submissão e resignação. Temer levantar os olhos aos céus para não adquirir uma atitude de soberba e arrogância.

Quem serve tem que ser servo, sempre.

 

BENEDITO

15/04/2022

 

----Paula Alves---

 

“COM JESUS A CAMINHADA É MAIS TRANQUILA E SEGURA. A VIDA TEM LEVEZA E COR”

 

Eu não era letrada, mas ouvir a Palavra me enchia o coração. Eu trabalhava na igreja toda quinta-feira. Me colocava a disposição de servir para ouvir o padre, para aprender.

Eu deixava para limpar bem pertinho do altar para ouvir e entender mais fácil.

Era bem difícil para mim, ainda mais quando falava em latim, mas eu sentia o que estava sendo dito, sabe aquela intuição?

Daí chegava em casa e falava com os meninos. Adorava as parábolas porque com elas eu sabia explicar melhor. Assim, fomos nos estruturando e eu consegui cuidar dos meus filhos com mais sensatez, com mais coragem e fé.        

Coisa linda de ver como a gente caminha mais confiante com o Evangelho. Mesmo sendo mãe solteira, eu consegui cuidar de todos e fazer com que entendessem que em toda parte tem um ser supremo que analisa os nossos passos.

Eles precisavam saber que não é tudo que podem fazer. Que temos que prestar contas dos nossos passos à Deus.

Eu aprendi muito com o Evangelho e quando o Fabinho aprendeu a ler, eu me dediquei e comprei uma Bíblia.

Meu Deus! Quanta honra poder ouvir a Palavra dentro da minha casa. Aquele momento era único para mim, meu filho lendo o Evangelho, eu até chorei.

Meus filhos cresceram tementes a Deus, cresceram certos de que deviam agradá-Lo em Espírito e verdade. Foi maravilhoso!

 

Se tornaram bons filhos, bons homens, respeitáveis e trabalhadores. Sempre lembravam de uma parábola que podia lhes instruir e tirar suas dúvidas. Era muito engraçado!

Em momentos duvidosos, recorriam ao Evangelho e Jesus dizia o que devia ser feito.

Nós vencemos as dificuldades. Não quer dizer que nós não sofremos, que ficamos isentos das dores ou percalços do caminho, mas que superamos todas as adversidades com coragem, fé e resignação. Sabendo que Deus colocava diante de nós os momentos mais brandos e nos colocaria diante dos olhos as soluções, mantendo a calma e a certeza dos cuidados de Deus por nós, sempre conseguimos superar as tribulações terrenas.

Com Jesus a caminhada é mais tranquila e segura. A vida tem leveza e cor. Eu aprendi muitas coisas e não tenho medo de retornar se Jesus estiver comigo, mas o mais importante é se colocar numa posição segura de estar com ele porque somos nós que temos que nos colocar diante do Mestre como reconhecedores do seu poder e da sua Palavra para todo o sempre.

 MARIA DA PAZ  

15/04/2022

--------Paula Alves----

“ACHO QUE TODO MUNDO PRECISA DESABAFAR, TORNAR A VIDA MAIS LEVE, AMENIZAR SEU FARDO OU TENTAR DIVIDI-LO”

 Dizem que “gato escaldado tem medo de água fria”. É bem verdade!

Saí daquela sala profundamente constrangida porque todos ficaram sabendo dos meus segredos confidenciados exclusivamente para ela porque achei que fossemos amigas.

Virei chacota! Como pode uma pessoa se aproveitar de seus segredos mais íntimos para ficar em evidência?

Isso aconteceu na minha fase juvenil e, depois disso, foi muito difícil ter outra pessoa que considerasse amiga.

Eu fugi de contatos íntimos e relacionamentos duradouros porque não confiava nas pessoas. No fundo, eu precisava de alguém. Um alguém que pudesse me ouvir. Acho que todo mundo precisa desabafar, tornar a vida mais leve, amenizar seu fardo ou tentar dividi-lo, mas eu não podia confiar.

Existem situações que abrem buracos no peito e a gente, por mais que queira, não consegue ser diferente.

A amizade é joia rara, tão rara que é difícil de se encontrar. Eu valorizava a amizade e desejava uma amizade sincera, mas temia ser enganada novamente.

Eu comecei a enxergar que as pessoas são abusadas e aproveitadoras. Sempre querem ganhar algum tipo de vantagem e usam umas às outras.

Aqueles que vivem cercados de amigos, comumente são aqueles que têm algo a oferecer e normalmente são coisas materiais. No mundo do “quem tem ganha”, as pessoas que ostentam são populares e tem um grande círculo de amigos, mas você pode perceber que nos revezes da vida, quando eles passam por dificuldades, os amigos fogem, somem e desaparecem sem deixarem vestígios.

Na hora do perrengue ou da tragédia poucos têm amigos reais.

Eu vi bem tudo isso quando me coloquei numa situação de inferioridade ou como um ser antissocial. A verdade é que, a maioria das pessoas, usa aqueles que têm o que se deseja.

O dono da casa na praia sempre tem amigos, o dono do carrão também. A pessoa mais inteligente pode ter amigos, principalmente quando ela faz as pesquisas ou pode colaborar para uma nota mais elevada, sei lá. Sempre existe um interesse, sabe?

Eu não tinha nada, nem era popular, nem muito bonita, nem rica, nada. Pessoinha comum, com trabalho, família para cuidar.

Depois, eu me casei e tive uma vida delicada como dona de casa, filhos com problemas de saúde e muita vontade de desabafar, que alguém pudesse me compreender e desse um empurrãozinho de vez em quando.

Mas, quanto mais sua vida é sem graça e cheia de dificuldades, mais as pessoas se afastam, é assim.

Então, quando ela apareceu e disse que desejava nos receber em sua casa, eu temi. Quem era aquela pessoa que queria a minha amizade? Eu não tinha nada a oferecer. Mas, quem não tem nada a perder, enfrenta a situação, fui.

A mulher era um amor de pessoa, toda delicada e muito simples. Casa aconchegante, comida saborosa e eu, com o pé atrás. Quem era aquele amor de pessoa? O marido dela era colega de trabalho do meu esposo. Pensei que fosse isso, ele queria a ajuda do meu marido, mas não.

Ela queria alguém para conversar, só isso.

A gente sempre tem algo a oferecer, sempre. Normalmente as nossas necessidades são as mesmas. Nós temos os mesmos temores e dificuldades, dor, alegrias, enfim, não diferimos muito uns dos outros. Eu me identifiquei muito com ela, foi uma bela afinidade. Conversa que fluiu tranquila, palavras que se completavam, uma maravilha de amizade nasceu em nós.

Esta minha amiga esteve comigo em todos os momentos marcantes a partir daí. Tudo o que houve para comemorarmos ou sofrermos, estávamos juntas, nos apoiando em tudo. Eu precisava daquela pessoa em minha vida. Para me ouvir e para me mostrar que eu não sou só. Eu agradeço muito a Deus por ter me mostrado que existem muitas pessoas boas que são amigas e leais.

Estas pessoas desejam apenas receberem nosso afeto e poderem se apoiar na amizade para caminhar neste mundo.

 

ISABEL

09/04/2022

 

-------Paula Alves------

“TODOS NÓS DEVEMOS VALORIZAR O QUE AS PESSOAS TÊM DE BOM E COMPREENDER QUE AQUELES QUE GOSTAM DE NÓS, ACEITAM NOSSAS FALHAS E DEFEITOS”

 

Eu me sentia excluída, mas queria ser aceita e fazia de tudo para isso. Até eu percebia que estava sendo falsa, no sentido de não ser natural. Eu forçava a barra e dizia coisas que não faziam meu gênero só para agradar.

Virou um vício. Eu era um camaleão. Gostava de azul com uma pessoa e de preto com outra pessoa, enfim, é fácil saber o que as pessoas querem ouvir. Basta alguns minutos de conversação e análise para saber do que as pessoas gostam e eu tentava ser a pessoa mais agradável do mundo.

Uma necessidade de ficar com esta pessoa, na casa dela, de reconhecer seus hábitos e saber como eram as sensações dela, seu contato com os familiares e amigos, tudo.

Foi complicado porque era como uma metamorfose, eu, aos poucos, me transformava naquela pessoa com as características dela e até a maneira de falar ou de expressão. Eu mudava o cabelo e as roupas de uma forma que causava espanto. Não era uma mudança drástica, então, em muitos casos, a pessoa só percebia quando um terceiro a alertava.

Era uma loucura da minha mente. Não sei explicar o que dava em mim.

No início parecia não oferecer risco algum, mas a coisa toda piorou quando eu quis ter tudo o que aquela colega possuía, ou seja, eu queria a vida dela, casa, marido e filhos. Se tornou uma obsessão, uma doença.

Eu armei situações e fui me envolvendo com o cônjuge porque é quase impossível para um homem resistir a tanta sedução. Quando ela percebeu apanhei demais, ela disse que o pior não era a traição que envolvia o cônjuge, mas toda a falta de lealdade, por eu ter feito parte do círculo de amigos mais íntimos e ter desonrado a sua confiança. Isso doeu mais do que a surra.

Naquele momento, foi um choque de consciência. Eu precisava ouvir umas verdades. A gente acha que não muda ninguém, mas as palavras ditas com tanta energização causam revoluções dentro da gente.

Eu me olhei no espelho e não sabia mais quem eu era. Procurei meus pais, contei toda a questão e eles me mostraram fotos de infância, adolescência, falaram que eu precisava de terapia. Eu me tratei por muitos anos, mas esta estranha obsessão não me larga. Não sei o que fazer...

Já ouvi aqui: “nós temos que saber quem somos”.

É necessário saber dos seus vícios e virtudes, suas tendências, suas motivações, seus desejos, gostos, pontos fracos, enfim, você precisa estar de posse da sua individualidade em qualquer parte para que possa progredir em qualquer parte.

Imprescindível se amar da forma como é. Reconhecendo que ainda tem muito para corrigir, mas que já avançou um bocado, eu entendi.

Já estou melhor. Tem dias que ainda me olho no espelho e não consigo ver as nuances definidas. Aqui é muito pior, eu pareço um borroco. Uma pintura que alguém tentou apagar. Mas, eu vou definir estes pensamentos, eu vou me definir. Acredito que é um passo a passo.

Todos nós devemos valorizar o que as pessoas têm de bom e compreender que aqueles que gostam de nós, aceitam nossas falhas e defeitos.

 

SORAIA

09/04/2022

 

-----Paula Alves----

 

“TODOS NÓS DEVEMOS REALIZAR A AUTO ANÁLISE PARA BUSCAR FATORES EM DESARMONIA E APLICAR O REAJUSTE ATRAVÉS DA ACEITAÇÃO.

 

Não podia ter falhas. Tudo impecável, sala, cozinha, quartos, cheirosos e ricamente decorados, assim tinha que ser, todos os dias.

Por isso, eu não deixava que eles brincassem. Podia sujar, bagunçar e tirar da ordem, da disciplina.

Toc? Na minha época não era assim. Muita gente tinha problemas, a gente achava estranha e tal, mas seguia a vida, cada um do seu jeito, na sua neura.

Era uma compulsão por organização que não me deixava receber visitas porque eles sujavam tudo e a minha casa virava um ninho. Como eu poderia viver sabendo que todos colocaram as mãos e sentaram nos meus sofás tão limpos?

 Era uma paranoia que me tirava o sono. Eu levantava a qualquer hora para limpar e colocar tudo em ordem, já estava arruinando o meu casamento porque, no auge, eu não quis que eles mexessem em nada e chorava desesperada falando das bactérias.

Um tormento! Ninguém queira saber o que se passa na cabeça de louco deste tipo. Eu nem sei como pode alguém deixar louça suja na pia, lixo para o outro dia, banheiro sem limpar, não sei.

Como consegue dormir sabendo que tem casa suja? Não sei.

Mas, passei por momentos tão terríveis por causa desta doença da mente. Perdi os meus afetos que não conseguiram mais viver comigo, passei por dificuldades físicas na velhice e o pior, a falta de higiene tomou conta de mim. Quando você envelhece sozinho e conta com a ajuda de desconhecidos, nem sempre, consegue tomar banho, nem sempre sabe como foi que cozinharam para você.

Na hora da necessidade a gente deixa de lado tanta frescura. Eu bebi do meu próprio veneno. Tanta dor no corpo não me permitia limpar a casa, cai lavando o banheiro e quebrei a perna.

Precisei de higiene no leito e a pessoa que cuidou de mim era bem diferente, não se importava com tanta limpeza como eu, sofri tendo que sentir meu próprio odor fétido, sentindo o corpo macilento, vendo minha casa cheia de lixo.

Foi um padecimento justo para que eu me curasse de tanto exagero, compreendi, mas ainda tenho meus problemas mentais para me libertar.

Todos nós devemos realizar a auto análise para buscar fatores em desarmonia e aplicar o reajuste através da aceitação e do esforço para que a Lei não nos aplique a sentença dolorosa.

 

SEVERINA

09/04/2022

 

-----Paula Alves------

 

“EU NÃO PODIA CRER QUE A LEI DO RETORNO IMPERAVA TÃO JUSTA E IMPONENTE”

 

Lá vinha ela carregando aquele monte de lixo, todos os dias. Aquela mulher me irritava porque eu sabia que ela não precisava daquela vida.

Ela mexia no lixo em busca de materiais recicláveis e eu ficava enojada porque ela tinha uma casa confortável e o marido tinha bom emprego, eles não eram flagelados na sociedade para chegar naquela situação.

Bem que pensei que ela devia ser alguma lunática que tenta guardar dinheiro no colchão. Mais uma avarenta que se veste de mendiga para extorquir o trabalhador. A ruina!

Levei meses observando e maldizendo a situação dela, nem me dei conta do quanto estava sendo maledicente.

Senti um pequeno desconforto na garganta, mas com a mudança climática nem me desgastei e fiquei preocupada com a família daquela mulher que devia passar tanta vergonha.

Os meses passaram e um dia, meu esposo chegou em casa dizendo que fomos convidados para um trabalho social no bairro. Trabalho que auxiliaria crianças do orfanato, tudo promovido na igreja, com ajuda de muitos moradores. Eu disse que nós tínhamos que participar para mostrar o quanto éramos bondosos com os carentes.

Minha garganta ficou pior, eu estava rouca e com um grande desconforto, mas não me abalei. Fomos ao encontro e me espantei com as lindas obras de arte que foram feitas para ajudar ao orfanato.

Eu fiquei incrivelmente animada e desejei adquiri-las, mas queria conhecer o artista, afinal a pessoa havia conseguido transformar sucata, lixo, em arte...

 Qual não foi meu espanto quando vi a minha vizinha muito bem arrumada, maquiada, sorrindo tão feliz? Ela era a artista que estava doando todo o trabalho para ajudar as crianças órfãs.

Meu queixo caiu. Intimamente tive a impressão que ela sabia o quanto eu havia falado mal dela, criticado o que fazia. Eu argumentei de tantas maneiras e nunca poderia imaginar qual seria a real finalidade de tudo aquilo.

Como uma pessoa podia mexer no lixo sem o menor constrangimento e doar tudo para aqueles que ela, sequer conhecia?

Me ofendi. A bondade dela me incomodou. Aí me irritou mesmo porque se ela fosse ruim, eu estaria tranquila para praguejar a vida dela, mas sendo uma mulher honesta, trabalhadora e bondosa, aquilo me feriu.

Feriu tanto que eu já não podia falar. Fui ao médico e descobri um câncer de garganta. Ah! Como eu podia ser castigada daquela maneira?

Eu sabia que era castigo pela forma como eu me comportava com todos. Minha vizinha não foi minha única vítima. Eu não podia crer que a Lei do Retorno imperava tão justa e imponente.

Foi desta forma que atravessei os planos. Desgaste orgânico ocasionado pela maledicência doutor. Um vício crítico que me encaminhou para as zonas de trevas e me fez lamentar poder proferir qualquer palavra.

Sei que tudo nasce do pensamento, mas estou solicitando a mudez. Creio que só não direi palavras amargas, se não puder proferi-las. Eu prefiro assim...

 MARTA

09/04/2022    

 -------Paula Alves------


“FELIZ É AQUELE QUE NÃO DEGENERA TÃO DRASTICAMENTE SEU CORPO FÍSICO”

 

Teria sido mais fácil se eu tivesse me conscientizado antes. Eles sempre estiveram ao meu lado e insistiam para que eu percebesse minhas falhas.

Nem sei como foi possível receber pessoas tão boas como familiares. Só podia ser a benção dos céus porque eu, em nada, me assemelhava a eles.

As lembranças trazem um grande arrependimento dos diversos deslizes que cometi conduzindo a vergonha moral, eles não mereciam.

Minha esposa sempre foi muito trabalhadora e foi, por isso, que sempre tivemos um teto e nunca passamos fome. Foram muitos os dias em que deixei de ir trabalhar porque estava completamente alcoolizado. Eu não conseguia me erguer, conjecturar dos fatos e necessidades. Eu não tinha responsabilidade.

 

Foi uma degradação moral que prejudicou toda a família.

Muito se engana aquele que pensa que seu vício não prejudica ninguém, além dele mesmo. O vício prejudica todos que se envolvem com ele de forma direta ou indireta.

Meus familiares podiam ter progredido muito, intelectual e moralmente. Podiam ter progredido financeiramente porque sempre foram estudiosos e trabalhadores, mas eu os comprometi. Do ponto de vista financeiro porque estava sempre comprometendo as finanças da família para quitar dívidas de buteco. Do ponto de vista moral e emocional porque eles não tinham estrutura para se desenvolverem livremente, devido a vergonha que sentiam, por conta do peso que eu lhes atirava nas costas. Eles eram apontados e não podiam erguer a cabeça, foram os filhos do bêbado, a mulher do pinguço.

O alcóolatra pode até arrancar risos das pessoas, servir de chacota na sociedade, mas ninguém nunca o levará a sério para assumir grandes responsabilidades e deveres, assim também serão os seus descendentes, desmoralizados, achincalhados.

Eu não percebi, enquanto estava encarnado.

O viciado é egoísta e cruel. Egoísta porque só pensa em si, em satisfazer suas necessidades. Cruel porque deplora sua família e vampiriza as energias daqueles que o rodeiam.

Precisei de tratamento médico e internações. Feliz é aquele que não degenera tão drasticamente seu corpo físico, mas eu abusei. Bebia para comemorar, porque estava feliz, para esquecer as mágoas da vida ou para ter coragem. Eu só sabia beber e tive graves comprometimentos no fígado. Quase morri, quase.

 O amor é algo muito inexplicável. Sentimento que salva, cura e reverte o mal que existe em nós, ser humano incauto, desonesto e ambicioso.

Eles me socorreram, me amparam e fui tão bem tratado que me senti alguém decente. Impedido de beber porque nem podia sair de casa, recebi as maiores provas de amor que alguém pode ter. Tanto respeito e devoção que me senti terrivelmente arrependido.

Quanta vergonha! As pessoas podem achar que o bebum não se lembra dos seus vacilos, não sabe o que apronta e não tem sensatez para saber o quanto feriu, mas isso é desculpa para aprontar novamente.

Eu me lembrei de tudo e me envergonhei deveras. Não prometi nada, senão para mim mesmo. Fiz um pacto comigo.

“Ó ser miserável! Tomai vergonha nesta cara infeliz e se esforce para abandonar suas mazelas. Se você não pode ser firme por você mesmo e por sua dignidade, então, que seja por honra e glória destas pessoas bondosas que te dedicam amor e afeição. Que Deus possa me fortalecer neste propósito. Amém”.

Foi assim que, dia após dia, superei o vício. Jamais consegui olhar para eles de cabeça bem erguida e firme de moralidade, mas consegui nos anos que me restaram ser um pai presente, sóbrio e um marido compromissado com meus deveres familiares.

Todos nós podemos abandonar os vícios com esforço e dedicação.

 

VIRGÍNIO

02/04/2022

 

 ----Paula Alves----

 

“INTERESSANTE PENSAR SEM O TORPOR DA DROGA”

 

Eu ficava com raiva de mim. Sabia que tudo aquilo acabava com a minha mãe. Eles foram pessoas maravilhosas que não mereceram ter em casa um filho mau e viciado como eu.

Tentei por diversas vezes ficar longe das bocas. Eu pensei que minha mãe estava certa quando que eu só fraquejei pelas más influências, mas eu nunca fui santo, eu seguia minha consciência, meus instintos.

Tão leviano, tão astuto, driblava minha mãe, eu a enganava. Roubei e sai escondido para ficar fumando e injetando drogas para ficar alucinado.

Os vizinhos se assustavam, me achavam caído nos becos e meus pais ficavam desesperados. Veja que o azar foi só comigo porque os outros filhos foram excepcionais: trabalhadores, sérios e amorosos com nossos pais. Foi, por isso, que tomaram a decisão de me internar.

Eu fiquei revoltado, gritei e quebrei tudo. Achei que eles queriam me punir, me aprisionar para sempre.

Como pode numa família onde sete são excelentes, ter uma maçã podre? Eu podia ter acabado com eles, mas aqueles que são realmente dignos, nunca se corrompem.

Fui internado, amaldiçoando-os. Disse que nunca mais os chamaria de “meus irmãos”, mamãe chorou e eu fui levado na camisa de força.

Levou muito tempo para desintoxicar, a vontade era tremenda. Não sei como consegui. Após meses de tratamento, vendo minha mãe mensalmente, chorando e fazendo solicitações cheias de queixas e manhas, eu comecei a raciocinar.

Parecia que aquela mente não era minha. Interessante pensar sem o torpor da droga. Muito estranho iniciar uma reabilitação desejando me erguer, me entregar a um caminho diferente, trabalho, estudo, progresso para mim e para eles, a libertação.

Saí, eles foram me buscar. Estavam felizes com meu comportamento e nem me conheciam, não sabiam o que eu pensava e se daria certo.

Todas as vezes que eu saia, minha mãe ficava ansiosa, temendo que eu tivesse uma recaída, mas eu resisti.

Não é fácil, parece que tem um bicho que te tenta. Um pensamento de estase sempre te faz lembrar que pode usar de novo, ser alguém diferente, mas eu me lembrava da família. Eu não podia decepcioná-los. Eles apostaram em mim, na minha recuperação, eu precisava cumprir a minha parte.

Foi assim que, após cinco anos levei um grande abraço dos meus pais. Eu estava me formando na faculdade de direito, trabalhava, estava noivo e completamente reformado.

Meus pais me abraçaram e chorando disseram que eu era uma benção de Deus. Um presente dos céus. Mamãe disse que ninguém deve se deixar vencer por um vício porque o amor cobre a multidão de pecados.

Ela falou que sabia que eu valia a pena. Ela investiu tudo em mim, sua paz, sua esperança, sua tolerância, tudo, todos os seus melhores sentimentos e eu fiz com que eles se unissem e progredissem nos elos de amor e dedicação ao próximo.

Meus pais falaram que existem muitos que desistem dos seus familiares quando os vícios arruínam as bases da união, mas aqueles que realmente se amam fazem de tudo para que a libertação aconteça, sem nunca perder a fé.

Eu devo tudo a Deus e a minha família.

Durante seis encarnações estive ligado a vícios que me arruinaram demais. Estas pessoas se comprometeram para me ajudar, eles se martirizaram por minha causa, mas por seu amor me ofertaram a liberdade. Graças a Deus.

 

RODRIGO

2/04/2022

 

----Paula Alves----

 

“PARE PARA PENSAR! ISSO ACONTECE O TEMPO TODO”

 

Ele me achou na rua. Quando nossos olhos se cruzaram, inexplicavelmente, eu me constrangi e soube que ele nunca seria um cliente.

Mas, ele me olhou e seguiu com os olhos firmes em mim.

Na outra noite, lá estava ele, me observando.

Foi como se nos reencontrássemos, mas eu nunca tinha visto aquele semblante. Eu sabia que ele nunca seria um cliente.

A vida de mulher de rua é deprimente. Fui muito apontada, todos diziam que existe emprego de verdade, vender o corpo é a profissão mais antiga do mundo e é imunda, cheia de podridão.

Quem é que gosta de ser tratada como lixo, algo descartável? Eu nunca gostei de nada daquilo, mas me lembro de tantos contatos, de tantas surras e descasos.

Não foi tudo ruim na minha vida, mas até aquele momento sempre pensei que a morte fosse libertação e aguardava por ela ansiosa.

De pequena, os abusos e como mulher eu sempre fui usada. Porque será que a mente nos conduz para os traumas do passado?

Eu nunca entendi porque me deixei levar para um futuro que me lembrava constantemente do ato de violência que sofri. Mas, foi a minha vida.

Assistia aquele filme da prostituta que é tirada da rua por um homem que se apaixona por ela e me intrigava pensar que um homem pudesse olhar para ela, como? Nós não servimos para comparação com moça que serve para casar.

Tem muita diferença e eu não me dignava a orar porque sentia vergonha de me comunicar com Deus. Achei que, se Ele existia, não devia se lembrar de mim, já havia me deixado de lado, então, eu me entregava a vida miserável que tinha até que a morte pudesse acabar com minhas lembranças.

Ah! Eu achei que era assim que funcionava...

Mas, o homem olhava para mim. Todos as noites no mesmo horário, lá estava ele, até que um dia, aquilo me incomodou e fui até lá.

— Como é bonitinho. Vai ficar só olhando? — falei.

— Estava esperando que você saísse desta posição e quisesse seguir em frente — falou ele.

Eu achei aquilo tudo bem estranho. Começamos a conversar e ele me falou que todos têm condições de modificar sua trajetória há qualquer momento, basta esforço e dedicação. Não adianta esperar cair do céu, tem que ter força de vontade e muito empenho. Nisso, veio a minha mente um local, ele falou que eu tinha que tentar. Quando eu olhei para o lado, ele sumiu.

Eu fiquei toda arrepiada. Naquela noite, fui para casa sem trabalhar.

Quando fui ao local indicado em meu pensamento, achei uma placa que dizia precisar de vendedora. Consegui o emprego, apesar da moça não gostar de mim, me medir dos pés a cabeça, enfim, eu arrumei um emprego diferente.

Aquele rapaz nunca mais apareceu. Passei a vida toda me perguntando se era do além ou gente de carne e osso, mas o fato é que depois daquele contato eu me modifiquei completamente.

Eu pensei muitas vezes porque me submeti à vida das ruas e da prostituição quando tudo o que eu precisava era de uma oportunidade de trabalho, mas para isso, eu tinha que correr atrás, tinha que me achar capaz, digna.

A maior parte da vida eu me menosprezei, eu me coloquei para baixo e não permiti que as coisas boas da vida me encontrassem. Culpei Deus de omisso, mas quantas oportunidades será que Ele colocou diante de mim e eu, nem sequer, percebi?

Pare para pensar! Isso acontece o tempo todo. Nos colocamos na vida como vítimas, sofredores e deixamos o esforço de lado para sermos coitados. Nisso, as melhores oportunidades aparecem e nem vemos. A vida passa e você naquela posição de sofrimento e inércia.

Tudo depende de nós. O esforço é nosso. Deus não desampara nenhum filho. Ele fornece tudo o que precisamos para mudarmos de vida, mas precisamos ter olhos para ver. Presta atenção!

 

OFÉLIA

02/04/2022

 

 ----Paula Alves----

 

 “QUEM NÃO SE ESFORÇA PARA PROGREDIR, DEVE DEPURAR NA BASE DO SOFRIMENTO”

 

Dívidas de jogo que não acabavam mais. Tive que vender a casa, minha mulher quase me matou. Era nosso único bem, nosso chão, nossa base, a nossa casa.

E eu não era de confiança. Um cara que usa o leite das crianças para apostar no jogo é de confiança?

Eu não tinha jeito e ela não me abandonou nem sei porque. Não era amor porque, após alguns anos fazendo picaretagem, percebi que ela já não me olhava com carinho e submissão. Ela não conversava comigo, não dividia seus anseios ou preocupações, ela trabalhava e cuidava dos nossos filhos, vida de trabalho árduo, sem descanso ou paz.

Eu chegava de madrugada e ela estava saindo para trabalhar, mas eu estava chegando da jogatina. Ela só respirava fundo, acho que se controlava para não quebrar o jarro na minha cabeça. Quanto controle emocional daquela mulher...

Se a gente se coloca no lugar do familiar nem sabe como teve tanta paciência e tolerância. Eu não sei como ela não me jogou na rua.

Foi aí que chegou a prova de fogo. Eu estava devendo uma grande quantia para a mesa de jogo. Eles estavam ameaçando minha vida, levei uma surra daquelas, nem sei como consegui chegar em casa.

Ela me viu, cuidou de mim, chorou e rogou a Deus que acabasse com aquela luta. Que fosse a Sua vontade porque ela estava indignada com aquele marido, que era eu.

Nossa! Que vergonha ouvir tudo aquilo, enquanto ela limpava meus ferimentos.

Ela olhou nos meus olhos e disse que pagaria a dívida e depois iria embora com nossos filhos. Se eu tivesse condição de me libertar daquele vício maldito, podia acompanha-los, mas se o vício era mais forte que a nossa união com a família, ela iria só com as crianças.

Meu corpo gelou, eu senti que ela estava sendo sincera, ela ia embora e eu ficaria sozinho na vida. Não quis não.

Eu podia me esforçar e me tornar um cara decente pela família. Argumentei que tentaria e conseguiria por amor a eles. Nós pagamos minha dívida e fomos embora dali, recomeçamos em outra cidade. Arrumei emprego, mas a tentação é grande demais.

Logo, estava envolvido com outra jogatina. Minha esposa percebeu na hora. Ela só falou que se comprometeu comigo mais de uma vez e não era boba. Falou que eu tinha feito a minha escolha.

No outro dia quando cheguei em casa, tudo estava limpo. No local, havia apenas meus poucos pertences. Nem sinal da esposa e dos filhos. Eu fui abandonado!

Chorei muito, me arrependi, mas compreendi a decisão dela. Ninguém é obrigado a aturar uma pessoa viciada e sem vergonha na cara.

Os familiares tentam, tentam, mas as pessoas devem escolher se progridem ou ficam estagnados junto com o viciado. As pessoas boas e trabalhadoras se esforçam para amparar, fazem de tudo para estimular a reabilitação moral, mas se o viciado depois de tantas tentativas escolhe o erro, então é pertinente que aqueles que o envolvem partam para o seu desenvolvimento. Isso é livre escolha. Não houve abandono algum.

A não ser da minha parte. Eu me abandonei. Fiquei parado no vício, consciência doentia, sem perspectiva de evolução, de nada.

Nunca mais tive noticia deles, eu me arruinei, me entreguei à bebida e um dia, cai na valeta e tive um acidente que me encaminhou para as regiões umbralinas onde pude colher o que cultivei.

Quem não se esforça para progredir, deve depurar na base do sofrimento.

 JULIÃO     

02/04/2022


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