Cartas de Junho (12)

 






 “Deus não desamparar nenhuma de Suas criaturas”

 

O difícil sempre foi me envolver com as pessoas, mas os animais eram maravilhosos. Eu me sentia amada e acolhida por eles.

Desde jovem, busquei meu caminho e tratei de ser independente para sair da casa dos meus pais porque sempre tive um relacionamento conturbado com meus familiares. Eles queriam impor a maneira de ser e agir, eu não tolerei e achei mais conveniente morar sozinha, mas a casa estava vazia e triste, eu não conseguia dormir com medo de tudo, então, resolvi adotar um cachorrinho.

Foi a melhor coisa que fiz. Aquele amigo encheu minha vida de alegria, eu não estava só. Sorria e cantava, parecia que ele me compreendia inteiramente e correspondia ao carinho que eu lhe ofertava. Eu trabalhava, estudava e vivia bem com meu amigo leal, nada me incomodava.

Mas, ele adoeceu e eu perdi o chão. Fiquei desesperada, ninguém podia entender por que eu sofria tanto com a enfermidade do meu bichinho de estimação, mas eu sabia que ele me sustentava emocionalmente. Mais do que qualquer ser humano, ele me entendia e respondia aos meus apelos de compreensão e amor. Amor sincero e completamente desprendido, ele não me exigia nada, apenas que eu também ofertasse afeto e atenção.

Quando vi que o fim estava próximo, eu não quis me distanciar dele, faltei no trabalho e na faculdade, muitas pessoas zombaram de mim quando souberam o motivo da minha ausência, me chamavam de antissocial.

Eu concordo que não me sentia bem no meio das pessoas, preferia os animais, eu desconfiava delas. Se, entre os familiares, sempre recebi menosprezo e era repelida, imagina com aqueles que não tinham vínculos consanguíneos ou afetivos...

Eu preferia os animais e, por isso, não queria perder meu melhor amigo, mas eu senti o quanto ele estava enfraquecido, era o momento da despedida e eu tentei ser forte para que ele pudesse continuar seu caminhar eterno.

Sofri tanto, mas tanto. Para mim, sem nenhuma diferença do que seria se tivesse perdido um amigo humano ou um parente, acho que senti mais. A solidão tomou conta da minha alma e eu não via graça nas coisas simples da vida, tudo me lembrava dele, todos os lugares da casa estavam com a presença do ser amigo. Imaginei que nunca mais desejaria outro bichinho para não sofrer em demasia, mas eu precisava de alguém, eu queria ter alguém para conversar e sorrir, então, uma vizinha sabendo do quanto eu gostava de bichinhos, me ofereceu um bichano. Foi um gato sapeca e muito amável. Ele fez com que eu pudesse sorrir novamente e me devolveu a alegria de viver.

Eu me tornei veterinária, a minha vocação sempre foi cuidar dos pets e eu fui imensamente feliz sentindo o amor que emanavam. Vivi muito, sempre cercada por felinos e dogs, seres incríveis que me fizeram ter grandes lições de vida. Quando desencarnei recebi o privilégio de assisti-los no desencarne. Foi o maior presente que eu poderia receber da espiritualidade de luz. Ampará-los também na espiritualidade...

O trabalho é lindo. Eu sei e presencio o amor na grande maioria dos casos. São muitos seres humanos que amam os animais e aprendem com eles a se tornarem pessoas mais sensíveis e generosas. Quando aparecem casos onde ocorreram torturas e maus tratos, ainda fico compadecida e agradeço por poder fazer parte da equipe que auxiliará no resgate destes pobres seres que padeceram nas mãos de almas cruéis. Deus não desamparar nenhuma de Suas criaturas. Os animais têm amparo e continuam seu processo evolutivo.

 Sabrina

01/06/24

 

    ***

 

“Só assim, podemos perceber o quanto o sofrimento é doloroso, sentindo na própria pele”

 

Depois do acidente fiquei muito mal, precisei de várias bolsas de sangue para conseguir sobreviver, então, os médicos solicitaram aos familiares e amigos porque se tratava de uma emergência.

Eu acreditava que o amor que as pessoas tinham por mim seria suficiente para que todos doassem uma bolsinha de sangue. Pensei mesmo que surgiriam tantos para me ajudar que sobraria sangue no estoque, após o pedido do médico, mas eu me equivoquei.

As pessoas tinham suas justificativas para não doarem. Cada um tinha um argumento para não doar, até os familiares mais próximos, meus irmãos não podiam doar porque já tinham feito tatuagem, porque estavam se sentindo fracos com uma gripe, minhas cunhadas estavam anêmicas, os mais velhos também não podiam doar.

Outros diziam que tinham feito a doação recentemente e não podiam doar. O fato é que eu estava necessitando de ajuda e não tinha quem pudesse me ajudar.

Eu não imaginava que era tão difícil! Naquele momento, eu não tive conhecimento disso, fui informada por uma enfermeira depois que me recuperei. O hospital utilizou o sangue que tinha disponível e eu soube que não colaboramos com a doação. Eu me senti muito mal, até porque, eu nunca havia pensado nisso. Eu fui uma pessoa completamente omissa nesta parte. Nunca me preocupei com isso, jamais saí de casa na intenção de doar sangue para ajudar aqueles que estão necessitando de doações para prolongarem suas vidas. Eu fui como tantos outros que, envolvidos na vida material, não pensam em nada e em ninguém.

A vida do “cada um por si”, nos faz compreender o quanto é dura estar sozinho. Não existe quem poderá nos ajudar se preciso for. Precisei passar por duras provas da vida para ter outra concepção diante deste assunto e me coloquei a disposição de servir e obter recursos para os anônimos que precisassem de sangue. No meu ambiente de trabalho, duas vezes por ano, eu pedia para as pessoas doarem, fazia panfletos com informações úteis e conseguia convencer muita gente a fazer a caridade através da doação de sangue.

Foram mais de trinta anos trabalhando ativamente para levar pessoas ao banco de sangue e isso me deixou extremamente feliz. Percebi que todos podem colaborar de alguma forma. Às vezes, acontecem coisas terríveis em nossas vidas e nos sentimos entristecidos, reclamamos e questionamos os motivos necessários para o nosso sofrimento e abandono, talvez seja para nos aproximarmos de outros sofredores e trabalharmos ativamente para eliminarmos a dor. Só assim, podemos perceber o quanto o sofrimento é doloroso, sentindo na própria pele.

 Luciana

01/06/24






“Nós só aprendemos a duras penas e aceitamos mudar de convicção quando pode nos custar a própria vida”

 

Nossa religião não aprovava uma iniciativa tão invasiva. Eu acreditava que precisávamos estar resignados à vontade de Deus e se fosse da Sua vontade que a morte se aproximasse de nós, não havia nada que pudéssemos fazer.

Quando fui informada de que minha mãe precisava fazer uma cirurgia, eu não aceitei, ainda mais quando o médico falou da transfusão de sangue. Era um absurdo! Colocar sangue de outra pessoa no corpo dela...

Eu não podia permitir, não era da vontade de Deus que ela se curasse daquela maneira, se fosse para viver, Deus operaria seu milagre.

Mas, a enfermeira falou que Deus colocou o conhecimento a disposição da equipe médica para que as pessoas fossem curadas, se eu amasse minha mãe, ia autorizar o tratamento e a transfusão, mas eu recusei.

Vivi muitos anos, pensando se eu tinha tomado a decisão correta. Vários familiares que não eram da mesma religião, me criticaram e acharam um absurdo que eu condenasse minha mãe a morte por causa de ser retrógrada, antiquada e desinformada.

Eu não quis falar com eles, me distanciei.

Anos se passaram e, um dia, quem recebeu um diagnóstico semelhante fui eu. Como se a vida fizesse questão de me ensinar aquilo que eu teimei não aprender. Eu precisava decidir se queria viver ou morrer por negligenciar o tratamento médico. Minhas filhas não eram religiosas e falaram da necessidade de ter uma mente mais aberta, aceitar os planos de Deus dentro das descobertas cientificas, também era necessário.

Mas, o que me motivou foi o medo. Eu não tenho vergonha de confessar. Eu tive medo da morte, preferi rejeitar tudo o que eu havia pregado até então e aceitar o tratamento e a transfusão por medo da morte. Eu me senti culpada e fracassada, mas recebi mais vinte anos para pensar no assunto.

Resolvi deixar a minha religião porque não me senti a vontade professando o que não vivenciava.

Assim, eu chego à conclusão de que nós só aprendemos a duras penas e aceitamos mudar de convicção quando pode nos custar a própria vida.

 

Guilhermina

 

          ***



“Doe sangue e ajude a manter a vida de alguém”

 

Muitos falam da prática da caridade e quando mencionamos caridade, no ato nos lembramos das cestas básicas e da quantidade imensa de pessoas que padecem de fome todos os dias no mundo inteiro.

Não precisa pensar longe, bem perto de nós, sempre existe alguém nas ruas precisando de um prato de comida para aguentar mais um dia.

Podemos nos lembrar do frio que mata nas ruas das cidades grandes onde são tantos marginalizados. Doação de cobertores, agasalhos e calçados que podem abençoar as noites de alguém.

Ao lado da doação material, nos lembraremos da caridade moral que leva incentivo e fé, oração que encaminha fluidos de refazimento e fortaleza moral. As palavras de esperança e confiança que encorajam e evitam as ruinas morais.

Tudo é caridade, mas muitas vezes nos esquecemos de que também podemos doar o que sai do nosso próprio corpo físico e salva vidas. O sangue faz parte destas doações. Assim, como a doação de órgãos, pode prolongar a vida de alguém e faz com que sejamos seres mais abnegados e amorosos, preocupados com o bem-estar alheio.

Doação de sangue deveria ser assunto de educação familiar, passado de geração para geração, como algo necessário para o desencargo de consciência de todos aqueles que desejam se elevar fazendo o bem.

Você é doador? Já doou sangue este ano? Está em bom estado de saúde para promover a caridade material e moral com o que seu corpo produz de benéfico e fundamental a conservação dos órgãos?

Nós devemos agradecer a Deus pela bendita oportunidade de podermos ser úteis e podermos ajudar, antes de necessitarmos de ajuda.

Estar numa condição enferma para necessitar de transfusão é algo inenarrável. Não conseguir conjecturar se vai continuar na carne ou não, abala os familiares que amam e devem se entregar nos braços de Deus, aguardando que a medicina se encarregue dos cuidados básicos e indispensáveis.

Doe sangue e ajude a manter a vida de alguém.

 

Vitório

01/06/24

    Psicografado por Paula Alves







“É preferível ser ferido do que ferir, receber uma ofensa do que ofender um semelhante”

 

Eu já sofria o bastante quando não tinha este tipo de conhecimento, capaz de gerar a culpa que aniquila o ser.

Compreendo que a responsabilidade deveria ser ensinada para todos os seres humanos desde que aprendam a se movimentar. Tão cedo possam raciocinar, devem ser estimulados a fazer conjecturas e se responsabilizarem por todas as decisões que tomam. Mas, eu não fui ensinado a pensar. O raciocínio e a lógica bem definidos fazem com que os homens possam analisar seus passos e possam prever seus erros e acertos.

Se eu pudesse prever... Se eu pudesse imaginar que, em decorrência, da minha imprudência e leviandade, tantas pessoas desencanariam naquele dia fatídico...

Eu jamais beberia e dirigiria.

Como um motorista de ônibus pode ser tão irresponsável?

E você ainda quer que eu me lembre com todos os detalhes? Mas, eu nem preciso me esforçar para alcançar este objetivo. O menor pensamento de crime, lesão, crueldade já me arremessa àquele dia.

Depois disso, fiquei me perguntando por que só eu não tinha morrido, eu me senti tão culpado com o acidente do ônibus, eu me senti tão perturbado com tantos corpos caídos ao chão que nem me dei conta de que eu também havia padecido.

O arrependimento doeu demais e me arrastou para o vale das sombras. Eu poderia ter recebido assistência imediata tamanho meu sofrimento em razão disso, mas eu não pude percebê-los.  

A pior coisa que existe é você desejar voltar no tempo para corrigir algo que você tenha feito e saber que é impossível.

Por isso, tantos dizem que, é preferível ser ferido do que ferir, receber uma ofensa do que ofender um semelhante.

Se eu tiver outra chance, desejo reparar o mal que fiz a estas pessoas. Eu desejo me recompor moralmente, me libertar do vício do álcool e, de alguma forma, ofertar uma vida melhor para estas pessoas.

Vocês explicaram que todos estavam ligados e, por isso, foi necessário um desencarne coletivo, mas “ai daquele que praticar o escândalo”.

Eu não devia estar envolvido, mas já que agora, estou ligado ao grupo, me concedam a oportunidade de auxiliá-los. É tudo o que desejo.

Luís Carlos

23/06/24

 

      *** 

 
“Se eu tivesse o bom senso de ter me colocado na condição alheia e sentisse o sofrimento do próximo...”

 

Eu me deparei com aquelas reflexões e iniciei a retrospectiva daquela vida de futilidade.

Lembrei de todas as possibilidades que tive de ser útil no ambiente em que estive inserida, utilizar os recursos financeiros para ajudar tantos sofredores que estiveram perto de mim, mas não fiz nada.

Eles pareciam estar sendo colocados em minha frente, surgiam de todos os lados, parecia que estavam me testando e eu sempre cometendo erros e fracassos pessoais. Eu não conseguia enxergar que poderia me elevar a partir da assistência prestada. Eu olhava para eles com indignação, como se estivessem me incomodando, atrapalhando nos momentos em que eu estava me alimentando, passeando, caminhando ou refletindo sobre os valore da vida.

Era a espiritualidade me dando diversas oportunidades de elevação a partir do amparo dos semelhante e, ainda assim, eu insistia em me concentrar no egoísmo e futilidades.

Eu ofendia com poucas palavras quando me solicitavam ajuda, outras vezes, nem sequer reparava neles ou então, me queixava do odor fétido que exalavam.

Como fui cruel com meus irmãos necessitados. Eu padeci após o desencarne, pois fui conduzida ao local onde tantos estavam estendendo as mãos, eles deixariam de me perseguir, mas nestas condições, eu não poderia ajudar, nem mesmo se desejasse.

Agora, deste lado, estou sendo esclarecida, já entendi a necessidade de depuração moral, para isso, voltarei em precária situação financeira, provavelmente, precisarei contar com a benevolência de outras pessoas para que possa sobreviver e me reerguer.

Se eu tivesse o bom senso de ter me colocado na condição alheia e sentisse o sofrimento do próximo...

Se eu tivesse seguido os conselhos de Jesus que nos pede para fazer aos outros aquilo que desejamos que nos seja feito...

Eu seria mais feliz.

 

Verônica

23/06/24

 

“As vidas sucessivas estão interligadas e cobram o que fizemos os outros sofrerem”

 

Vendedor de sorvete. Eu poderia ter sido um homem bem instruído e diplomado, da mesma forma que fui em existências anteriores.

Tenho a certeza de que, devido a capacidade intelectual desenvolvida, eu poderia ter progredido na ordem social, teria me beneficiado financeiramente porque eu sempre soube conquistar boa posição de acordo com minha instrução e objetivos de vida.

Mas, eu percebi que não conseguia pensar como antes. Parecia que minha mente estava bloqueada, eu não raciocinava direito, uma simples adição era difícil demais para o meu cérebro. Fui enganado tantas vezes porque não consegui fazer continhas rápidas e errei no troco.

As pessoas não sabem ser honestas, eles me roubavam pelo simples prazer de sentir-se esperto. Muitos, gostam de acreditar que enganando um trouxa podem se sobressair, eles ainda contam para os amigos fazendo gracejos.

Mas, a culpa era minha que falava o valor errado, foram poucas as vezes que os fregueses pagavam o valor correto, apesar da minha falta de raciocínio.

Eu demorei para perceber o motivo de tudo isso. Diversas vezes, me senti injustiçado, tolo, ingênuo.

Apenas quando cheguei aqui pude notar que foi a minha provação maior. Eu precisei vir com um cérebro físico limitado para sentir na pele o que é ser explorado, apesar dos seus esforços para ser honesto e trabalhador.

Em outra existência, fui um político que ganhou muito dinheiro, muito mesmo. Eu poderia ter tido a vida confortável que tive e, ainda assim, ter ajudado milhares de pessoas com meu trabalho sério e as doações materiais. Mas, eu me esqueci de todos, eu nunca me preocupei com todos que passam privações e necessitam de ajuda.

Eu tive a consciência de que todos aqueles recursos financeiros podiam beneficiar tanta gente e não me esforcei para ampará-los.

As vidas sucessivas estão interligadas e cobram o que fizemos os outros sofrerem.

Eu compreendi que minha pena foi bem leve, apesar do tanto que prejudiquei meus irmãos pela ambição e egoísmo.

Desta vez, de plena consciência de minhas responsabilidades sociais, desejo realizar trabalhos sérios e altruístas, estou me adaptando para isso, estudando e ouvindo outros tantos que, através de trabalho sério puderam se desenvolver moralmente. Eu agradeço por todos os esclarecimentos que me deram.

 

Leopoldo

23/06/24

 

 *** 


“Só as vidas sucessivas podem esclarecer”

 

Eu sabia que ele me amava como louco, seria capaz de fazer qualquer coisa por mim. Tamanha devoção que não se encontra aos montes por aí.

Realmente, eu não conseguia entender por que aquele homem tão perspicaz gostava tanto de mim, mas confesso, eu me senti lisonjeada e me deixei envolver, mas eu nunca nutri por ele aquele amor fenomenal. Eu conseguiria viver sem ele muito bem, parecia que me havia deixado levar por aquele sentimento que parecia ser suficiente para nós dois.

Imagino que vivi bem com ele, enquanto o homem foi capaz de fazer tudo por mim. Ele era bem-sucedido, tinha estabilidade financeira, bonito, falava bem, charmoso, enfim, ele tinha requisitos que o tornavam um homem cheio de qualidades. Isso me forneceu uma vida muito confortável durante algumas décadas, mas aos poucos, as coisas foram mudando.

Nós envelhecemos, mudamos muito, o que me atraia foi ficando feio, deselegante, chato, entediante, mas isso não foi o pior.

Com a idade, chegam os problemas de saúde, as debilidades orgânicas, a fraqueza, as dificuldades, a aposentadoria, a ociosidade que faz com que qualquer pessoa perca o seu charme.

Ele foi me irritando, cheguei a pensar em ir embora, mas eu também estava acostumada com ele, não tinha ânimo para começar tudo de novo e me acomodei naquele relacionamento de fachada.

O momento pior foi quando ele adoeceu, eu devia ter mostrado solidariedade e ter sido caridosa, cuidando dele, apoiando e fortalecendo na fase difícil, mas invés disso, eu o abandonei porque não consegui suportar aqueles dias intermináveis de dor, mau odor, gemidos, grosserias, sem perspectiva de melhora.

Lembrei de quando nos conhecemos e da necessidade que eu tinha de ser cuidada, paparicada. Reconheci que não amava aquele homem o suficiente para me sujeitar a enfrentar aquela situação tão desagradável e sugeri que a família dele ofertasse os cuidados adequados, eu não poderia ficar responsável por ele, estado deplorável que eu não podia suportar. Eu estava sofrendo demais cuidando dele, sabendo que morreria a qualquer instante, então, preferi me afastar dele.

Sei que ele se ofendeu, sentiu minha falta, notou que meu amor não era o suficiente para ficar ao seu lado na doença e na dor. Ele tentou me amaldiçoar, desejou que eu sofresse muito.

Depois que ele morreu, parecia até que eu sentia a presença dele me cobrando por tudo o que eu poderia fazer e não fiz. Ele só queria a minha presença e o meu apoio, mas eu neguei por falta de amor e excesso de egoísmo.

Sofri a culpa e o remorso, chorei muito no enterro, meu coração doía. Mas, agora virá o resgate. Eu serei sua filha e nascerei com deficiência motora. Vou necessitar de todos os cuidados dos meus pais para que possa me desenvolver e ser independente. Eu espero que possa contar com seus cuidados.

Muitas vezes, nós recebemos insultos de alguém e não entendemos o motivo de sermos tratados com rispidez e falta de cordialidade, só as vidas sucessivas podem esclarecer.

 

Paloma

23/06/24

Psicografado por Paula Alves 

“É muito provável que um dia você também precise”

 

Eu senti a dor e me espantei com a quantidade de sangue. Pensei que aquele era o fim, não seria possível salvar minha vida depois do golpe terrível com as ferragens do veículo.

Só pensei nos meus filhos. Eu não tinha medo da morte, mas temia em deixá-los, ainda tão pequenos, eles precisariam da mãe em tantos momentos que deveriam fortalecer sua identidade. Eu precisava ser forte e tentar resistir para estar ao lado deles, mas não sabia se teria forças para aguardar até o resgate chegar.

Orei, pedi sinceramente e do fundo do coração para que Deus pudesse me manter viva em benefício dos meus pequeninos. Clamei para que meu corpo tivesse forças para aguentar.

Mas, havia perdido muito sangue... Então, o resgate chegou, me levaram rapidamente para o hospital e fizeram tudo para me salvar. Tenho a certeza de que aqueles trabalhadores da saúde foram os responsáveis por meu salvamento, pela possibilidade de prolongar meus dias de encarnada, mas agradecida principalmente aos doadores daquele sangue que me nutriu e beneficiou.

As pessoas não podem mensurar o quanto o sangue salva vidas e pode fazer com que meus filhos estivessem ligados à mãe durante mais de quarenta anos, depois daquele episódio.

Sem palavras para agradecer tão generoso ato de amor e devoção ao próximo. Quem doa sangue, doa vida e permite prosseguir.

Eu não podia agradecer a pessoa que me ajudou doando o seu sangue, então me propus ajudar de uma forma diferente, eu me comprometi a fazer doações periódicas até o dia que fosse possível. Passei a ser doadora de sangue, assim como o meu esposo e filhos, já crescidos.

Em minha família, foi um objetivo que procuramos passar de geração a geração. Doar sangue como uma forma de agradecer aos benefícios que recebemos naquele dia.

São muitos, inúmeros que necessitam deste tipo de amparo diariamente. Em decorrência aos acidentes de trânsito, cirurgias eletivas ou paliativas, em casos assim, há grande perda de sangue e o paciente precisa de reposição do volume perdido. Parece tão simples, mas há um pequeno inconveniente, o número de doadores.

Como em muitas circunstâncias da vida, não deveria haver preocupação com este tipo de coisa, preocupação com a ausência do recurso que salva vidas, mas o problema é que muitos não podem ou não querem doar.

Existem pessoas que preferem não pensar neste tipo de coisa e só param para refletir quando precisam do recurso em questão.

Eu queria que ninguém jamais precisasse de uma transfusão de sangue, mas é muito provável que um dia você também precise.

Lembre-se: quem faz o bem, colhe o bem. É da Lei do Retorno.

Que o sangue seja importante vertente de recuperação, restabelecimento e energia orgânica. Que todos que necessitem possam ser beneficiados.

Que você possa ser útil e ajudar, de forma desinteressada, os irmãos que sofrem e desejam prosseguir.

 

Luzinete

 29/06/24

  ***


“O preconceito morava dentro de mim”

 

 Ele chorava e se batia, pequeno, fazia sons estranhos e eu não conseguia dormir. Acho que, o fato de não adormecer em paz e reparar minhas energias, me deixava ainda mais nervosa, me faltava paciência e eu batia nele.

A agressão gerava um comportamento ainda mais retraído e eu me sentia culpada com aqueles hábitos estranhos e inabilidade social.

A culpa das mães que percebem que os filhos não são felizes. Eu desejava que ele fosse igual as outras crianças. Queria que ele pudesse brincar e ser feliz, falasse e mostrasse compreensão com minhas frases simples, mas ele era alheio e vivia num mundo particular onde ninguém ousava entrar.

Eu confesso que tive vergonha do meu pequeno, eu não sabia o que ele tinha para ser tão diferente dos outros. Desejei que pudesse ser tratado, mas os médicos sugeriam que ele tinha retardo mental e nada podia ser feito, então, depois de um tempo, achei que fosse conveniente ficarmos em casa, distante dos envolvimentos sociais que faziam com que ele se irritasse e me envergonhasse diante de todos.

Ele cresceu, eu envelheci. Me senti triste e infeliz porque me distanciei do convívio social, até que meu esposo pediu para que eu aceitasse meu filho.

Na hora, eu achei aquilo um absurdo porque ele era meu filho, ninguém podia amá-lo mais do que eu, porém, fui obrigada a entender que meu esposo tinha razão. O preconceito morava dentro de mim.

Eu desejei um filho e otimizei como deveria ser o comportamento dele, como isso ia abrir as portas da sociedade para nós porque um filho lindo e inteligente, todos gostam de ter por perto. Uma criança educada e atenciosa todos querem ter por perto, mas ninguém queria meu filho, nem eu!

Aceitei minha discriminação, ele era diferente e eu tinha que entender o que se passava no meu interior, se eu realmente o amava. Olhei para ele e para mim. Fiquei tão envergonhada diante de Deus.

Eu amava aquele menino, independente de suas limitações, eu não queria me distanciar dele. Então, fiz um convite:

— Vamos tomar sorvete?

Ele adorava sorvete e nunca quis sair com ele, mas após aquele dia, saí e me diverti tentando sentir e entender o que ele vivenciava. Como podia me comunicar com ele, o que se passava em seu coração e em sua mente delicada.

Muitos de nós são assim, não perceberam o quanto são preconceituosos e tornam as pessoas mais próximas ainda mais infelizes, dificultando o relacionamento fraterno e a evolução recíproca.

 

Geane

  29/06/24

  ***

 
 “Doação de sangue, em benefício de todos!”

 

Ele precisou de doação durante aquela fase difícil de nossas vidas. Uma criança que sofre um acidente doméstico grave precisando de cirurgia. Eu quase enlouqueci e soube que precisava providenciar alguns doadores de sangue porque o hospital não tinha recursos para administrar tudo o que ele precisava para salvar sua vida.

As pessoas eram tão ignorantes! Ninguém podia doar, sempre inventavam alguma justificativa para informarem que queriam ajudar, mas não podiam doar. Tudo balela! Achavam que podiam se contaminar ou podiam passar mal, outros em decorrência da religião, achavam que eu não devia usar estes recursos para salvar a vida da criança. Imagina!

Eu faria de tudo para salvar a vida do meu filho, mas naquele momento, eu precisava de sangue. Eu precisava que as pessoas fossem abnegadas e fossem doadoras.

Fui à igreja, conversei com o padre e pedi para fazer um apelo no meio da missa, após muita insistência ele permitiu. Eu pedi aos pais, por amor aos seus filhos que pudesse me ajudar e eles foram tocados pelos benfeitores espirituais, eles se comoveram com meu desespero e fizeram suas doações.

Eu faria novamente, pediria nas ruas, mas acredito que as pessoas devam realizar este ato de amor sem a necessidade de vivenciar em sua própria casa este desespero. Além de se preocupar com o acidente e a sobrevida do seu ente querido, você ainda tem que se preocupar se haverá sangue suficiente?

É um absurdo!

Doação de sangue, em benefício de todos!

Marlene

 29/06/24

 

     ***

 
“Será que o nosso amor é tão puro e capaz de superar o preconceito?”

 

A ligação que tínhamos foi de antigos tempos. União de amor e afinidade. Minha filha sempre me contemplou com os melhores momentos das minhas existências.

Assim que nasceu, demonstrou ser diferente das outras crianças, eu percebi, mas isso não fez com que meu amor e devotamento fossem menores.

Na verdade, ela me encantava em tudo. Eu aproveitava cada momentozinho para sorrir com ela, mas os familiares insistiam em mencionar que ela tinha atraso, que era menos inteligente que os outros, meu marido dizia que teríamos muitas dificuldades na criação dela e que, provavelmente, seria uma encalhada que viveria às custas dos irmãos.

Aquilo me indignava! Sabe aquele pai que tem adoração pelos filhos que são perfeitos? Filho que tira boa nota, que faz tudo o que o pai deseja, que é mais bonito, forte ou inteligente que os demais? Meu marido foi destes.

Eu não permitia que fossem tratados com desigualdade ou predileção, mas ele fez exatamente isso e dividiu nossos filhos.

Isabela sempre foi rejeitada por todos, pelo pai e pelos irmãos. Isso me trouxe grande preocupação porque eu temia se viesse a faltar. Quem ficaria com ela, quem poderia assegurar seus direitos e necessidades?

Eu fazia artesanato e comecei a guardar tudo o que ganhava para fazer uma poupança para minha menina. Isso foi de grande ajuda.

A verdade é que nós temos que ser realistas. Deus nos coloca uma prova para enfrentarmos e encontrarmos os melhores caminhos de vencermos a tarefa difícil. Procuremos as soluções e sejamos criativos. Eu procurava, silenciosamente, alguém que tivesse bom relacionamento com ela e percebi que uma sobrinha mais velha que a Isabela tinha bem querer por ela, paciência e dava a atenção que ela gostava de receber. Fiz um documento, como um testamento, indicando que ela seria responsável pela menina se algo viesse a suceder comigo.

Parecia que eu estava adivinhando. Seis meses depois, eu desencarnei. Foi muito difícil me separar dela por causa das necessidades que ela apresentava e do amor que nutria pela menina.

A minha sobrinha recebeu o advogado e o testamento, ela chorou de emoção e mentalmente informou que jamais deixaria que minha filha passasse por qualquer tipo de privação.

As limitações físicas e intelectuais são grandes provações, não apenas para os portadores como também para os familiares que devem se colocar no lugar daquele que deve se superar todos os dias e precisa de apoio.

Amar além das aparências e limitações, amar e ser instrumento de elevação, esta é mais uma prova. Será que o nosso amor é tão puro e capaz de superar o preconceito?

Marília

 29/06/24

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